sábado, 30 de junho de 2012

Florbela Espanca

SEREJO: O encanto de Clarice

 Por: Vicente Serejo

Foi bem no início dos anos setenta. Este cronista era um jovem de alma tenra, anos ainda feitos de pouquíssimas descobertas, quando caiu nos olhos, pela primeira vez, um livro de poucas páginas, a capa tingida de um vermelho acenourado. Uma publicação do governo do Amazonas, com um título assim: ‘O mundo de Clarice Lispector’. Acima, um nome desconhecido: Bendito Nunes. Abaixo, uma palavra entre parêntesis: (ensaio). Dentro, um mundo impenetrável mesmo para um jovem curioso. 

 Menino do interior quando chega aqui não é nunca como menino de cidade. É tanto que arrasta no matolão uma ingenuidade que, mesmo na idade adulta, aqui e ali, luta para sobreviver entre feras. Anos depois, o livro guardado e sem uso, ouvi outra vez o nome daquela escritora, mas já tocada do primeiro encanto, na voz de Caetano Veloso, a perguntar nos ouvidos deste país tropical: ‘Que mistério tem Clarice?’. Os anos sessenta ainda ardiam. De Paris a Natal, a Londres Nordestina à beira de mar.

 E veio um último encantamento, no Rio, nos belos salões do Centro Cultural Banco do Brasil, ali na Rua Primeiro de Março, de espaços ovalados sob uma abóbada dourada e solene. A primeira grande exposição dedicada a Clarice Lispector com frases cintilando em neons pelas paredes, fotografias, e aqueles seus olhos amendoados, misteriosos e encantadores. Descobri ali, naquela manhã, a beleza da mulher e da escritora. E tive inveja de Diva Cunha que um dia a conheceu, conversou, ouviu sua voz.

Clarice já estava morta, mas nunca mais deixei de amar Clarice. Do pequeno livro que guardei sem ler, parti como um descobridor de olhos gulosos. Reuni o que pude de Benedito Nunes não só sobre a sua obra, seus ensaios que fazem da filosofia uma ferramenta para olhar a literatura e, sobretudo, olhar Clarice. Hoje tenho tudo ou quase tudo. De perto e de longe. E sonhei escrever um ensaio sobre suas reticências, sua incompletude, como se todas as coisas fossem inacabadas. Mas confesso: cadê tutano?

 Não teria a pretensão de descomplicar Clarice. Pra quê? Um ensaio intencionalmente superado, feito daquela argamassa impressionista e sem método, longe dos crivos acadêmicos. Uma conversa na sala de Clarice. Ali, onde ficava com sua máquina de escrever no colo, o cachorro enroscado nas pernas do sofá, cigarro aceso. Sem medo do seu olhar tão temido, de falar em bruxas e bruxarias. Talvez sobre a sua paixão impossível por Lúcio Cardozo a quem, ardendo de desejos, chamou de Corcel de fogo.

Voltaria, uma a uma, como um rastejador, a todas as suas biografias. Para medir cada olhar, cada toque sobre a pele. De Nadia Battella Gotlib – Uma História que se Conta – a Benjamin Moser naquele seu olhar misterioso, com vírgula e sem mais nada, assim – Clarice, – como se fosse continuar a dizer mais alguma coisa e onde afirma que o macaibense Renard Perez um dia fez aquela que pode ser a mais longa e confessional das entrevistas de Clarice. Conversa que Perez incluiu no segundo volume dos seus Escritores Contemporâneos, Civilização Brasileira, Rio, 1971. Até chegar ao recente olhar português de Carlos Mendes de Souza com as figuras da escrita.

E depois, como a cobrir suas pegadas no baixo-relevo das suas leituras e releituras, percorreria os livros do grande Bendito Nunes. O filósofo do povo da floresta que faleceu ano passado, aos 81 anos, o primeiro a perceber em Lispector o tudo pronto, mas inacabado. Só Clarice seria capaz de avisar que cada pessoa se inventa um dia depois de nascer. Uma pessoa, diz Clarice no seu grito surdo, nunca é ela mesma. Precisa sempre se reinventar.  Ou, numa estocada bem no rosto do leitor: uma pessoa é outra.

 E, a partir daí, misturaria tudo. Sem nenhum pudor acadêmico, só por não acreditar que seria possível separá-las, compreendê-las longe uma da outra, distantes como realidades desiguais. A vida e a obra. Sem nenhuma obrigação de ser original. Talvez com aquele mesmo tom da magoada frustração que um dia li em André Maurois na abertura do seu ensaio tristemente belo sobre Catherine Mansfield ao lembrar seu desejo de conversar com Tchekhov, à noite, num grande quarto um pouco sombrio…

POROCA: Carregar sapos e engolir pedras

 José Carlos L. Poroca - Advogado, executivo do segmento shopping centers

jcporoca@uol.com.br

 Li ou ouvi em algum lugar que americana come pedras há mais de 20 anos. A notícia também falava que o mesmo distúrbio de Dona Teresa, a personagem, leva as pessoas a comer madeira, roupas, metal e até papel higiênico. Não estou inventando história. Conheci uma senhora - a avó de Lula e Alexandre - que ficava cutucando os tijolos do muro da casa, retirando pedaços e levando-os à boca. Às vezes, ficava com vários pedacinhos na mão como uma espécie de estoque de reserva. Perguntei a alguém, não lembro quem, porque aquela vovó comia barro.

Responderam que o organismo necessitava de ferro e comer barro era uma das formas de atender a carência pleiteada pelo corpo. Anos na frente, vi documentário sobre macacos - estou na dúvida se eram gorilas ou orangotangos - que comiam o que já havia sido descomido. A explicação foi mais ampla: o método servia para reprocessar o que não pode ser absorvido no primeiro processamento.

O processo de sobrevivência imposto pela natureza vai de uma linha que a gente pode chamar de natural ou de instinto - a critério do freguês -, como a que vivem os animais que comem plantas para mexer no metabolismo interno e para 'curar' indisposições, até outra, no campo oposto, onde se encontram as espécies pensantes que se alimentam do necessário, do mais que necessário, do inimaginável e do inusitado, como o personagem da letra/música de Carlos Lyra e Vinicius de Moraes, que comia "vrídio" na Praia de Copacabana para juntar uma graninha.

A história (ficção) já completou 1/2 século e o País, que tem a 7ª ou 8ª economia do mundo, ainda convive com os seus comedores de giletes. Hoje, as lâminas são outras e descem goela abaixo sem pedir 'por favor' ou 'com licença'. Começa pela 'navalha' chamada de imposto de renda, de apetite incontrolável, caminha por uma carga tributária que, de tanto receber medalhas de prata e ouro, não pode mais concorrer, é hors-concours. A fila aumenta com a compensação que precisa ser dada para cobrir os buracos dos que 'bicam' um naco aqui e outro ali, produzindo o que pode ser chamado de esforço improdutivo para quem paga tributo, ou, de outro modo, um passo para frente e dois para trás.

O Brasil desenvolvido ainda tem outros tipos de comedores de giletes: os que vão para os lixões atrás de sobras e do sustento; os que comem produtos com volume e peso, que dão a sensação de 'boa sustância'; e os que colocam para dentro o que lhes aparece: preás, lagartos e assemelhados, tanajuras e tatus, para completar a carga. Há outro tipo, especial, que um dia foi chamado de classe média. Não a de hoje, que subiu degraus sem preencher os requisitos de renda para a classificação adequada.

A classe média brasileira 'prepetê' - aquela que se enquadrava numa determinada faixa de renda para ficar entre os ricos e os pobres - está no desgastante estica e puxa, sendo obrigada a um esforço inglório de ter que carregar sapos e engolir pedras, sem poder fazer cara feia, numa situação muito parecida com a dos hermanos argentinos: sem tango e com remota chance de volta.

domingo, 17 de junho de 2012

SEREJO: Luz no Vaticano

Por: Vicente Serejo

De vez em quando, Senhor Redator, esta coluna paga um tributo pela pobre ousadia de noticiar o que alguns consideram segredos de sacristia. É que para alguns clérigos mais conservadores o sol forte da opinião pública não deve cair sobre as igrejas entrando pelas frestas. Não notam que hoje os olhos do mundo não estão mais fora dos muros do Vaticano e por isso se surpreendem, habituados ao jogo de poder que durante séculos foi pecado, quando eram pecadores os que tentavam descobrir seus segredos.

O nariz de cera, bem de doze, é só para dizer que no dia 15 de abril o jornal Público, de Lisboa, estampava na primeira página da edição de domingo, o mais lida pelo católico povo português, a crise que desabou sobre o Vaticano. Ainda não era como depois passou a ser, um noticiário intenso, além de alguns textos de especialistas italianos, numa realidade aberta.  Ali o jornal já denunciava, e com amplos detalhes, o que chamou de uma perda de controle do Papa Bento XVI e de um perigoso clima de cisma.

A Igreja sempre enfrentou crises ao longo dos seus mais de dois mil anos. Se de um lado sua bela longevidade a faz eterna, de outro gera por isso mesmo uma disputa de espaços entre dogmas e leis. Não é difícil para os grandes analistas europeus essa tarefa de identificar os problemas e fragilidades de uma Igreja que ao mesmo tempo é Estado. Mesmo quando envolve a vida de sua santidade, o Pontífice, a quem a tradição ungiu acima do erro quando prega a palavra de Deus, mas é humano enquanto chefe.

 Imagine se esta coluna provinciana, por alguma razão curiosa, começasse um texto sobre nossa Cúria Natalense, assim: ‘A Cúria Romana tornou-se um monstro ingovernável que o próprio Papa, de perfil, sobretudo, intelectual e acadêmico, já não consegue controlar’. Pois é assim que começa o longo texto de António Marujo, correspondente do jornal Público junto ao Vaticano. E logo depois afirma de vez: ‘A estrutura central do catolicismo parece colada com cuspo. Bento XVI já não tem mão na Cúria’.

 Isto mostra, Senhor Redator, que não há mais espaço inviolável no mundo. Nem na Igreja. A não ser os seus sacrários. E não é lá que estão – acredite – os muitos e graves interesses que hoje gravitam em torno dos velhos muros vaticanos. Dentro e fora há articulações que pelejam entre conflitos e tradições hoje contestadas, e denúncias de corrupção, como o roubo de cartas e documentos dirigidos ao Papa, fato que acabou determinando a prisão do seu mordomo, o que não é comum na vida da Cúria Romana.

 Culto, embora demonstrando não ser mais um administrador de pulso forte, Bento XVI há pouco tempo, na sua fala no Consistório, ao anunciar a nomeação de 22 novos cardeais, avisou àqueles que ainda tinham dúvidas que não acreditassem, como futuros administradores, nos ‘sonhos de glória’. Cardíaco e frágil, mesmo discreto na doença, Sua Santidade sabe da força política incontrolável do ambicioso cardeal Tarcisio Bertone. É mais ousado do que ele próprio foi no reinado de João Paulo II.

POROCA: Para quê?

José Carlos L. Poroca
Executivo do segmento de shopping centers
jcporoca@uol.com.br

Tenho vivido uma nova fase de porquês. Uma criaturazinha de pouco mais de dois anos e meio é a principal responsável, naquela fase da extrema curiosidade e da necessidade de entender coisas que nós, adultos e adúlteros, não conseguimos explicar. Não tem nada a ver com grandes mistérios, como o da Santíssima Trindade. Coisas simples, que às vezes não temos condições de responder ou, dizendo melhor, não sabemos responder de forma convincente. Vem o primeiro "por que?"; a seguir, o segundo e o terceiro, desdobramento do primeiro, e assim por diante.

Além de tentar me desdobrar na tentativa de buscar explicação para o nem sempre explicável, também estou vivendo outra fase, a do "para que?". É provável que seja fruto da idade. Já passei dos 40 - estou repetindo para quem não sabe ou para os mais curiosos. Sou um jovem, quase um adolescente. Votei pela primeira vez na eleição presidencial no final da década de 80 (Collor x Lula). Idade à parte, repito que estou tendo as duas experiências ("por que?" e "para que?") nas duas pontas e, se não pirar até a Copa de 2014, passarei para a fase seguinte. É certo que lá encontrarei uma bifurcação mostrando dois caminhos: o renascimento ou a ressurreição. Não são iguais. Não dá para explicar, não neste momento, não neste espaço.

Um dos últimos "para que?" surgiu a partir de notícia divulgada na mídia sobre um leilão de uma calcinha da Rainha Elizabeth II, vendida por US$ 18mil (cerca de R$ 36mil, o preço de um automóvel). A peça, com monograma real, foi esquecida pela monarca num país sul-americano que a rainha visitou há alguns anos. Não vejo nada de excepcional no esquecimento (rainhas também tem lapsos de memória) e não vejo como incomum o fato de alguém guardar a calçola de uma celebridade como recordação. Conheço uma pessoa que ficou quinze dias sem lavar o rosto beijado por um famoso. Quando a coisa estava ficando feia (e suja) a mãe deu duas opções: água e sabão ou o chinelo. Marque opção1. Volto à calçola. O que me deixa intrigado e curioso é: o que arrematante vai fazer com a dita lingerie britânica?

Surge um "para que?" a cada dia. Basta abrir um jornal ou acessar qualquer portal de notícias na Internet. Promover enchimento exagerado de seios e dos glúteos: para que? Desembolsar mais de um milhão de dólares por carrão para ficar se exibindo no engarrafamento de qualquer capital brasileira: para que? Construir mansão de vinte quartos quando só moram no espaço três pessoas, não mais que quatro ou cinco: para que? Fazer das tripas coração para fazer cirurgias de tentar embelezar o que não pode ser embelezado: para que? Marcar ponto na igreja toda semana, quando a alma já está 'encomendada': para que?

A lista é extensa e vou parar por aqui. Cada um faz o que quer de sua vida e não cabe a mim ficar fazendo questionamentos sobre comportamentos e sobre o uso de grana alheia. Minto. Há um "pra que?" que envolve a minha contribuição e, como tal, tenho o dever de questionar: gastar milhões para promover uma CPI que já se sabe o resultado: para que?

segunda-feira, 11 de junho de 2012

Elis Regina - Cais

SEREJO: Da Ensinança de bem cavalgar

Por: Vicente Serejo

Há alguns meses, acho que ainda no início do ano, registrei aqui o lançamento do Dicionário do Cavalo – grandeza e legado, de Claudio Fornari e Lannes Caminha, edição do Senado Federal. Volume de quinhentas páginas, com mancha impressa disposta em duas colunas, e que já nasceu com o timbre dos livros indispensáveis. Do que nos fala de perto, e é justo citar, a presença na bibliografia de Veríssimo de Melo e Oswaldo Lamartine, assim como uma estranha ausência do grandioso sertão de Câmara Cascudo.

Deixei prometido que falaria do cavalo nordestino, nascido do chão e das águas velhas dos rios da tradição sertaneja. Para não ser acusado de deslembrado, pago a dívida. Convivi com Oswaldo Lamartine e, da convivência, nutri uns tantos saberes e uns tantos gostos, todos refinados, daí – pra que negar? – o requinte de algumas presenças silenciosas nestas prateleiras. Como duas edições, uma mais nova e mais completa, do Livro de Ensinança de Bem Cavalgar toda Sela, do prendadíssimo El-Rey Dom Duarte.

Oswaldo conhecia como poucos a história do cavalo. Era por gosto e prazer que falava sobre a origem do cavalo nordestino que um dia foi nobre, vindo dos velhíssimos prados da Península Ibérica para se adaptar ao sertão, e formando, o homem e o bicho, um conjunto perfeito. Baixo e mirrado, como ele gostava de dizer, de andadura segura e casco rígido a suportar, sem medo e sem dor, o chão duro do sertão; pulmão forte, esgueirando-se, o vaqueiro e o homem, debaixo da galharia espinhosa da caatinga.

Pois bem. Conhecia e usava a expressão Marialvas, de origem portuguesa, século dezessete, e que se usava para designar a qualidade de bom cavaleiro, discípulo do Marquês de Marialva. Tanto sabia que dizia ter sido Eloy de Souza um dos maiores Marialvas no sertão do Rio Grande do Norte, no toque leve e majestoso das rédeas. Mas, estranhamente, não fez constar no seu Vocabulário do Criatório que escreveu de parceria com Guilherme de Azevedo com duas edições, a segunda de 1997, esta revisada e definitiva.

 E se não fez constar os verbetes Marialvas e Marialvismo, como estão nas páginas do Dicionário do Cavalo, foi por alguma razão. Nada naqueles seus olhos miúdos e enxutos sobrava ou faltava quando derramados sobre a paisagem íntima do sertão. A explicação está na página 81 do seu Vocabulário, no verbete Galvão. Talvez, para o desavisado do mundo sertanejo, tivesse sido mais objetivo fazer a entrada na letra ‘s’ – Sinais de Galvão. Preferiu assim, desobrigando o leitor da busca pela vaga expressão sinais.

Na verdade, Senhor Redator, e salvaguardados esses detalhes, é essencial fixar a importância dos Sinais de Galvão para que o leitor não julgue ser esta conversa um devaneio vadio e sem prumo. Oswaldo preferiu ir ao sertão para registrar ter sido Galvão ‘mestre entre a vaqueirice do sertão velho’, o autor das regras seletivas para os cavalos ‘baseadas em seu exterior’. E completa: ‘Até hoje o seu nome é sinônimo de grande conhecedor de cavalos’. E vai citar todas as suas leituras que começam em Florival Seraine.

Oswaldo ergue o verbete Galvão sem medir espaço, cheio de citações, preenchendo o vazio que ficara na primeira edição do Vocabulário do Criatório, pelo Serviço de Informação Agrícola, Coleção Estudos Brasileiros n. 23, Rio, 1966. Na verdade, ele leu o único exemplar original que existe no Brasil, no Real Gabinete Português de Leitura do livro Arte de Cavalaria de Gineta e Estardiota; bom humor de ferrar e alveitaria. E só para saber a origem de Galvão e seus sinais, bons e maus, no clássico português.

 Os Sinais de Galvão foram polêmicos no Ceará. Martinz de Aguiar publicou artigo sobre suas raízes na Revista do Instituto Histórico do Ceará em 1934, e foi contestado pelo folclorista Leonardo Motta no jornal A Rua, novembro do mesmo ano. Aguiar respondeu, fechando o debate. Na Antologia do Folclore Cearense, Lourival Seraine, o organizador, não abrigou a luta. Fez constar o artigo de Martinz de Aguiar para representá-lo e de Leonardo Mota o ensaio A Poesia dos Cantadores, retirado do livro Cantadores, prefácio de Câmara Cascudo. É tudo que existe aqui, Senhor Redator, sobre Os Sinais de Galvão. Fica o registro da ausência no Dicionário do Cavalo. Eis a paga, portanto, da dívida prometida. 

Escritor Ivan Lessa morre em Londres

Por Redação, com BBC – Brasil

Escritor e cronista, Ivan Lessa morre aos 77 anos em sua casa em Londres

O escritor e cronista Ivan Lessa, colunista da BBC Brasil, morreu na tarde da última sexta-feira em Londres, aos 77 anos.

Ivan era colaborador da BBC desde janeiro de 1978, quando deixou o Brasil para se radicar na capital britânica.

Ao lado de nomes como Millôr Fernandes, Jaguar, Ziraldo, Tarso de Castro e Sérgio Cabral, ele foi dos fundadores do jornal O Pasquim, que ganhou fama com a resistência à censura promovida pela ditadura militar.

Ao lado do cartunista Jaguar, também cofundador do Pasquim, criou o personagem Sig, o ratinho inspirado em Sigmund Freud que se tornou o símbolo da publicação.

Ivan publicou três livros - Garotos da Fuzarca (1986), Ivan Vê o Mundo – Crônicas de Londres (1999) e O Luar e a Rainha (2005). Também participou do livro Eles Foram para Petrópolis, de 2009, uma compilação da sua troca de correspondência por e-mails com o amigo e também jornalista Mario Sérgio Conti.

Ele também trabalhou na TV Globo e foi colaborador de diversas publicações brasileiras, entre elas as revistas Senhor, Veja e Playboy, e os jornais Folha de S.Paulo, O Estado de S.Paulo e o Jornal do Brasil.

Nos últimos anos, Ivan vinha publicando três colunas semanais no site da BBC Brasil – a última delas publicada na manhã de sexta-feira.

Antes de se mudar definitivamente para a Grã-Breranha, em 1978, o escritor já havia passado um período de três anos na cidade, entre 1968 e 1972, também trabalhando para o então chamado serviço brasileiro da BBC de Londres.

Após sua mudança, em 1978, ele retornou apenas uma vez ao Brasil, para uma breve visita em 2006, a convite da revista Piauí, para escrever um artigo sobre suas impressões do Rio de Janeiro após 28 anos de ausência.

Ivan Lessa morre em Londres; leia sua última crônica

Por Vermelho

O jornalista, cronista e escritor Ivan Lessa, de 77 anos, morreu nesta sexta-feira (8) em sua casa em Londres. Lessa morava na Inglaterra desde 1978 e era colunista da BBC Brasil.

Ivan Pinheiro Themudo Lessa nasceu em 9 de maio de 1935, em São Paulo, mas foi criado no Rio de Janeiro.

Segundo sua viúva, Elizabeth, ele sofria de enfisema pulmonar e tinha problemas respiratórios graves. Mas o motivo da morte ainda não é conhecido. Ela disse que, ao chegar à noite em casa, encontrou Ivan Lessa morto em seu escritório. Ela estima que ele tenha morrido entre as 16h e as 18h30, pelo horário local.

Foi fundador, em 1969, e um dos principais colaboradores do jornal critico e satírico “O Pasquim”, durante os anos de resistência à ditadura militar brasileira.

No “Pasquim”, ele escreveu, entre outras, a coluna “Gip! Gip! Nheco! Nheco!”, “Fotonovelas” e os “Diários de Londres”. Ele também criou, em parceria com o cartunista Jaguar, o ratinho Sig, símbolo da publicação.

Ivan Lessa trabalhou e colaborou com vários órgãos de imprensa, como a TV Globo, as revistas “Senhor”, “Veja” e “Playboy” e os jornais “Folha de S. Paulo”, “Estado de S.Paulo”, “Jornal do Brasil” e “Gazeta Mercantil”. Também trabalhou como publicitário.

Leia sua última coluna, publicada na manhã da sexta-feira (8) em que Lessa ironiza a morte:



Orlando Porto. Taí um nome como outro qualquer. Podia ser corretor de imóveis, deputado, ministro, farmacêutico. Mas não é. Trata-se de um anagrama de um escritor francês – e ator e ilustrador bom e autor e figurinha difícil francesa e aquilo que se poderia chamar de “frasista”.

Feio como um demônio, no meio da década de 1950 cansei de dar com ele dando comigo lá pelo Boulevard St. Germain, cheretando o Flore, o Lipp, fazia uma cara que quem ia dizer algo importante e logo sumia na companhia do Jean-Pierre Léaud, aquele maluquinho dos filmes autobiográficos do Truffaut.

Dupla estranha. Os desenhos do – esse seu nome, artístico ou de batismo, Roland Topor- eram bacaninhas. Mas sempre foi Orlando Porto para mim.

Fez cinema também. O Inquilino do Polanski, o Reinfeld de Nosferatu, do Werner Herzog. Até que bateu o que ocultava seus pés: umas botas estranhas como ele.

De vez em quando, numa revista esotérica, dou com ele. Ei-lo numa em inglês com “100 boas frases para eu matar agorinha mesmo”. Se chegou ao fim, e chegou, foi pelo cachê. Meros galicismos literários.

E aí trago à cena, mais uma vez, porque cismei, mestre Millôr Fernandes. Esse era profissional. Nada a ver com “frasista”. Trabalhava com a enxada dura da língua. Nunca para dar a cara no Flore, principalmente com Topor e Léaud.

Reli umas 100 frases do Orlando, ou Topor, e não resisti à tentação de, em algumas delas dar-lhes uma ginga por cima e outra por baixo, à maneira do frescobol querido do mestre, só para exercitar os músculos muito fora de forma.

Cem razões: Faço por bem menos, mas mais Copacabana e Leblon. Algumas raquetadas minhas em homenagem ao mestre cuja falta continuo sentindo:

- Melhor maneira de verificar, antes, se já não estou morto.

- Mas não se mata cavalos e malfeitores?

- Pelo menos eu driblaria o câncer.

- Milênio algum jamais me assustará.

- Apanhei-te horóscopo! Pura enganação!

- Levo comigo a reputação de meu terapeuta.

- Pronto, agora não voto mais mesmo! Chegou!

- Aí está: uma cura definitiva para a calvície.

- Enfim cavaleiro do reino de sei lá o quê.

- A vida está pelos olhos da cara. Pra morte eles fazem um precinho especial, combinado?

- Enfim, ano bissexto nunca mais. Esses ficam para o Jaguar. O resto pro Ziraldo.

- Ao menos é uma boca de menos a sustentar.

- Só quero ver quanta gente vai sincera no meu funeral.

- Pronto! Inaugurei estilo novo: Arte Morta.

- Sabe que minha vida não daria um filme. O livro eu já escrevi. Deixem o desgraçado em paz, peço-lhes.

- Custou, mas estou acima de qualquer lei que vocês bolarem aí.

- Levou tempo, mas cortei enfim meu cordão umbilical.

- Roncar, nunca mais. Nem eu nem ninguém ao meu lado.

- Que desperdício nunca ter fumado em minha vida!

- Consegui preservar o mistério sempre girando em meu torno.

- Maioria silenciosa? Essa agora é comigo.

- Na verdade, nunca me senti à vontade nessa posição incômoda de cidadão do mundo.

- Ei, juventude, pode vir que pelo menos uma vaga está aberta.

- Emagrecer é isso aqui.

- Agora é conferir se, do outro lado, sobraram tantas virgens assim.

E assim, cada vez que um “frasista” passar por perto de mim, leve uma nossa: minha e de Millôr. Dois contra um, a gente ganha mole.

Com informações do G1

sábado, 9 de junho de 2012

Padre Sabino Gentilli: o profeta do morro

SEREJO: Fermento na massa

Por: Vicente Serejo

Em 2001, foi fundado o Centro de Convivência Espaço Solidário, em Mãe Luiza, pelo padre Sabino Gentili. Esse Espaço fora fruto do projeto Amigos da Comunidade, do Centro Sócio-Pastoral N. Sra. da Conceição (CSPNSC) de Mãe Luiza, que identificou grande número de idosos em situação de abandono. Assim, mais uma demanda social era alvo de uma ação concreta de uma comunidade que tem urgência de que as políticas públicas funcionem, mas que continua desassistida por estas.

 Quando o Centro Sócio-Pastoral N. Sra. da Conceição (CSPNSC) é erguido, em Mãe Luiza, em regime de mutirão, há um histórico de lutas da comunidade para permanecer no bairro. Era o ano de 1983. Na sua Ata de fundação, o padre Sabino Gentili, seu idealizador e fundador, afirma que o Centro deverá ser espaço de vivência para toda a comunidade e um instrumento para que esta pense sobre seus problemas e busque as alternativas para solucioná-los. E assim vem sendo.

 O depoimento do saudoso padre Sabino nos diz que uma das primeiras ações do Centro foi a partir da doação de um dinheiro que sobrara da colação de grau de uma turma de Direito da UFRN. Havia muita gente morando precariamente. Então, formou-se uma comissão do próprio bairro para tomar conta do dinheiro e ajudar  algumas dessas pessoas que viviam em situação degradante a melhorar as suas moradias. Também os conflitos com os fiscais da prefeitura eram constantes. Quem não lembra do terrível Eliseu Satanás? Aquele que não tinha nem dó nem piedade de derrubar os barracos de muitas famílias… Tanto que virou bordão: “Eliseu Satanás derrubava os barracos de dia e o povo os levantava de noite”. Também aí, foi o Centro Sócio-Pastoral o apoio de muita gente sem-teto que buscava permanecer lutando por seu pedaço de chão.

 Então, o CSPNSC, instrumento da ação de padre Sabino Gentili, deu respaldo às demandas da comunidade de Mãe Luiza: tornou-se espaço de reunião, aberto a toda a comunidade; passou a abrigar projetos vários em atenção à criança, ao adolescente, à formação profissional, ao idoso. Na oferta de educação infantil, de reforço escolar, de alfabetização de jovens e adultos; de cursos profissionalizantes e de preparação par ao vestibular, de idiomas; na assistência à saúde de crianças, gestantes e idosos. Recebeu até prêmio do UNICEF pelo projeto “Amigos da Comunidade, que consistia em identificar, encaminhar ao médico e acompanhar mães gestantes e crianças até 1 ano de idade ou que estivessem em estado de desnutrição. A ação reduziu a mortalidade infantil no bairro, que hoje se assemelha a padrões europeus.

 Mais que tudo, esse espaço de convivência, sonhado por padre Sabino, tornou-se realmente a referência quando o assunto é mobilização comunitária. Tendo a tolerância e o diálogo como principais ferramentas, o CSPNSC é aquele laboratório onde se gestam idéias, onde se provocam as pessoas para que falem de sua vida, de seus problemas, que também se misturam com os da comunidade. Nesse processo, educa-se para que as pessoas caminhem com as próprias pernas, para que não desistam de sonhar nem de lutar. Educa-se para que o sentido da vida em comum não se perca para que não se percam os filhos de Mãe Luiza.

Lá se vão 29 anos, desde a sua fundação. Três espaços instituídos pelo Centro Sócio cumprem a tarefa hercúlea de cuidar da parcela mais desassistida pelos serviços públicos: a Escola Espaço Livre, que atende 210 crianças na Educação Infantil; a Casa Crescer, escola de segundo turno para crianças e adolescentes com dificuldades na escola de leitura, escrita e matemática. Além do reforço, a Casa Crescer atua para o desenvolvimento da sensibilidade estética e do espírito esportivo dessas crianças e jovens. E o Espaço Solidário, lar de convivência para idosos em situação de risco social, que atende em torno de 25 idosos que moram lá, além de mais de 30 que passam o dia na Instituição.

 Neste ano de 2012, será iniciada uma campanha de ajuda para autossustentação do Espaço Solidário, que vive de doações e do que deveria ser o repasse financeiro da Prefeitura de Natal ao abrigo.

 É preciso que a sociedade se sensibilize com a causa daqueles que já deram sua parcela de contribuição à vida deste País, mas cujo retorno tem sido na maioria das vezes a exclusão social.

Mãe Luiza, com todas as suas carências, dá uma lição de vida, ao se prontificar a cuidar de seus idosos. Assim, espera-se que as demais parcelas da população, cristãs ou não, de posição moral em favor da família, de militância contra a exclusão, de discurso em prol da solidariedade e do companheirismo demonstrem todo esse espírito de alteridade, numa ação concreta em favor dos idosos do Espaço Solidário.

Estudo da OIT identifica quase 21 milhões de pessoas vítimas de trabalho forçado no mundo

Quase 21 milhões de pessoas são vítimas de trabalho forçado no mundo, sendo 90% delas exploradas em atividades da economia privada, por indivíduos ou empresas, revela um estudo da Organização Internacional do Trabalho (OIT) lançado hoje (1/07). Já a participação de Estados foi identificada na exploração do trabalho forçado em 2,2 milhões dos casos, em prisões que violam normas internacionais ou atividades impostas por forças armadas rebeldes ou exércitos nacionais.

O estudo, intitulado “Estimativa Global da OIT sobre Trabalho Forçado 2012″, detalha as diferentes violações e a incidência nos setores da economia: 4,5 milhões (22%) são vítimas de exploração sexual forçada e 14,2 milhões (68%) são vítimas de exploração do trabalho forçado em atividades econômicas como agricultura, construção civil, trabalho doméstico ou industrial.

“Percorremos um longo caminho nos últimos sete anos desde quando apresentamos as primeiras estimativas sobre o número de pessoas em trabalho ou serviços forçados no mundo. Também tivemos progresso ao assegurar que a maioria dos países tenham uma legislação que penalize o trabalho forçado, o tráfico de seres humanos e as práticas análogas à escravidão”, declarou Diretora do Programa Especial de Ação para Combater o Trabalho Forçado da OIT, Beate Andrees.

Observando a idade dos trabalhadores forçados, 5,5 milhões (26%) estão abaixo de 18 anos. A região de Ásia e Pacífico apresenta o número mais alto de trabalhadores forçados no mundo, com 11,7 milhões de vítimas (56 % do total geral), seguida pela África, com 3,7 milhões (18%) e América Latina, com 1,8 milhão (9%).

Mundo avança em apenas quatro das 90 metas para meio ambiente, revela relatório do PNUMA

O mundo avançou em apenas quatro das 90 metas e objetivos para o meio ambiente contidas em acordos internacionais, revelou a quinta edição do Panorama Ambiental Global (GEO-5, na sigla em inglês) lançado hoje (06/06)  pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), no Rio de Janeiro. Houve avanços apenas nas metas de eliminação da produção e uso de substâncias que destroem a camada de ozônio, na eliminação do uso de chumbo em combustíveis, no acesso crescente a fontes melhoradas de água e em mais pesquisas para reduzir a poluição do meio ambiente marinho.

“Este relatório fala diretamente à Rio+20. É um trabalho feito pelo PNUMA em nome das Nações Unidas como uma contribuição para as discussões da Conferência. Fala sobre um novo entendimento do ambientalismo no século XXI, mostrando fatos e caminhos para o debate”, afirmou o Diretor Executivo do PNUMA, Achim Steiner. Ele também destacou que, se forem mantidas as atuais tendências de consumo de recursos naturais, logo os governos precisarão “administrar níveis sem precedentes de danos e degradação” e a solução pode estar na implementação global do conceito de Economia Verde. No conteúdo do GEO-5 ainda estão destacados estudos de caso e boas práticas já aplicadas pelo mundo e que são exemplos de desenvolvimento sustentável e respeito ao meio ambiente.



Na cerimônia de lançamento do GEO-5 estiveram presentes além do Diretor Executivo do PNUMA, a Coordenadora Executiva da Conferência Rio+20, Henrietta Elizabeth Thompson, a Chefe do Setor de Avaliação Científica do Programa, Fatoumata Keita-Ouane, o Secretário de Políticas e Programas de Pesquisa e Desenvolvimento do Ministério da Ciência e Tecnologia do Brasil, Carlos Nobre, e o Secretário de Mudanças Climáticas e Qualidade Ambiental do Brasil, Carlos Klink.

A Coordenadora Executiva da ONU para a Rio+20, Henrietta Elizabeth Thompson, considera que o GEO-5 é uma das mais importantes ferramentas para as discussões sobre meio ambiente já feitas pela ONU. “Acredito que o lançamento desse relatório deve significar aos países, empresas, cidadãos, líderes, o porquê de estarmos aqui no Rio. O Geo-5 nos apresenta o atual estado do planeta e mostra as consequências sociais, econômicas e ambientais se não tomarmos as decisões apropriadas nos próximos dias. Esta Conferência pode ser a plataforma para servir na transição do mundo para uma economia em que tenhamos maior respeito aos recursos naturais e a forma com os consumimos, com um maior investimento em capital humano, social e natural pensando no desenvolvimento que seja sustentável”.

Especificamente para o Brasil, o GEO-5 diz que o desafio abrange dois componentes. O primeiro determina a busca de melhoria da qualidade de vida nas áreas já ocupadas, sobretudo nas grandes áreas urbanas, onde as concentrações populacionais estão degradando em ampla escala os recursos naturais (água, por exemplo). O segundo desafio consiste em garantir a preservação e exploração consciente dos recursos naturais restantes através da gestão sustentável desses recursos.

Após o lançamento do GEO-5 foi realizado um debate com especialistas que participaram do relatório.

sexta-feira, 8 de junho de 2012

Caetano - Terra

POROCA: Vou morrer

Por: José Carlos L. Poroca
Executivo de Shopping Centers

Ao dizer “vou morrer” posso não estar dizendo nada, absolutamente nada. É o destino de todos nós, valendo até para os que receberam o canudo de imortais. Também não quero fazer drama ou inventar doença, para amolecer corações e obter vantagens de qualquer natureza. Pode ser que, neste momento, seja portador de algum mal que antecipe o meu ‘até logo’ ou o meu ‘adeus’, mas, por suposição, nada que não possa aguardar a Copa de 2014.

Ao dizer “vou morrer”, assim, de supetão, posso estar decepcionando os mais próximos que aguardavam a promessa feita de superar o recorde familiar pertencente a meu pai, que emplacou cem anos e dois meses. Mas, entendam, agora admito, ele viveu num tempo em que a palavra empenhada era mais forte que o papel assinado. Hoje, nem a assinatura reconhecida em cartório tem valia, é vista com desdém, como ‘coisa do passado’.

Quero justificar o “vou morrer” pelo choque que se repete a cada trinta dias quando recebo o contracheque. A distância entre o bruto e o líquido é quase a distância entre a terra e a lua. O esforço é inglório: trabalho doze meses no ano e só chegam menos de oito meses na minha conta. É como se o meu motorzinho tivesse uma configuração de 120hps (exagerei?) e fosse dele exigido uma produtividade de 150 a 160hps. A máquina não aguenta.

Se não for pelo esforço, há outras hipóteses pela possibilidade de antecipação do the end: a bala e o susto. Descarto o vício – que seria a terceira hipótese – porque os meus vícios não fazem mal, ou, melhor dizendo, fazem um mal pequeno, menor. A bala poderá vir de qualquer lado, de cima ou de baixo, nunca se sabe. Do jeito que as balas estão indisciplinadas, poderei ser atingido até nos sonhos. Se for assim, menos mal: mesmo com o sangue e a dor da cena, ficarei satisfeito porque o acordar virá mais cedo ou mais tarde, o que não impedirá nem diminuirá o risco do furo no peito ou na cabeça que todo brasileiro pode levar nos tempos de hoje.

O susto tem tudo para ser a causa mortis, já admitindo que nenhum profissional vá querer colocar que o óbito ocorreu pela ação inesperada que interferiu no metabolismo ou que foi excesso de adrenalina provocado por forte emoção. Independente do que vai no obituário, repito que o susto é a bola da vez, o mais cotado, o que tem mais chances. Não à toa. As emoções do dia a dia, seja pela perda do campeonato do meu time, seja pelo aparecimento como corrupto de paladino que se apostava como exceção à regra. E nem vou falar noutras emoções vividas pelos portadores de carteira profissional, que precisam derrubar uma alcateia por dia.

O coraçãozinho é forte e aguentará os trancos até quando chegar a hora. Enquanto o trem não vem, apelo para os amigos e para quem ler este trecho: contribuam para que os anos vindouros sejam mais agradáveis e mais confortáveis para este nordestino de sobrenome dinamarquês. A casa aceita dinheiro (real, dólar, euro – tanto faz), cheques com suficiência de fundos, pacotes de viagem (Europa, preferencialmente). Se for na executiva, melhor. A família agradece.

SEREJO: Oposição?

Por: Vicente Serejo

Nem diria, Senhor Redator, da bizarrice que é a aliança PMDB-DEM nesta terra que foi berço de Poti. Ele mesmo, o Camarão, se nosso ou dos pernambucanos, pouco importa, tinha também seus encantos pelo poder. Tanto é verdade que os poderosos da época lhe outorgaram um título inventado de Governador Geral dos Índios do Brasil e ele nunca mais lutou. Virou um herói a favor que, de resto, é o que há de mais melancólico na vida de um guerreiro. E ficamos assim até esses dias feios de hoje.

 Na beleza deste rio, neste mar e nestas dunas não há mais uma vocação oposicionista. Houve no passado, embora cruel para não dizer desumana. Quando Cortez Pereira foi vítima de um furor que o massacrou com um tropel enlouquecido. Até quase nada restar, se é que pode ficar alguma coisa num homem cassado, exilado na própria casa, sitiado pela injustiça, prisioneiro da vergonha diante da sua família e do seu povo. E morrer alguns anos depois sem riqueza, a não ser o que sempre teve na vida.

 Ali, uma Paz Pública nascida no lodo dos interesses palacianos matou a oposição para sempre. E ficou tão morta que quando o próprio Aluizio Alves tentou reacendê-la nas ruas contra ‘o menino de Tarcísio’, era tarde. O velho feiticeiro de sessenta já não tinha aquela magia a desfazer o feitiço do mal e tombou derrotado por mais de cem mil votos nas ruas da cidade onde ele havia sido seu maior líder popular. Nunca mais houve oposição. Só uma troca de guarda entre adversários e correligionários. Só.

 De lá pra cá, são os mesmos. Sempre. José Agripino e Wilma de Faria numa eleição se aliavam e na outra se enfrentavam, assim como contra e a favor de Henrique Alves e Garibaldi Filho. Acima ou abaixo dos partidos com suas bandeiras rotas e descoloridas. E viemos, eleição a eleição, aferventando simulacros até hoje. De quando em vez, um instante de perfeição perversa, como quando o PMDB foi às ruas e derrotou o senador Fernando Bezerra, velho amigo de décadas, para eleger Rosalba Ciarlini.

Não há mais correligionários e adversários no Rio Grande do Norte nas últimas décadas. Estamos diante de um imenso governo que se metamorfoseia a cada nova situação alternando os pólos de situação e oposição, controlando a todos e a cada um dando uma ração de cargo público em troca do silêncio quieto. E como não se faz uma sociedade democrática sem pólos em torno dos quais possam girar os centros de força de cada luta, coube à sociedade ir às ruas, avaliar e julgar os agentes políticos.

Esta pode ser a razão do que dizem ser o inimigo invisível que avalia, julga e até agora condena o governo Rosalba Ciarlini. Está nas ruas a reação. Sem líder e sem retórica. Num silêncio eloqüente que hoje desafia os bruxos do marketing. Como se não bastasse, o novo episódio com o PSB cobra a expulsar dois vereadores por um compromisso da ex-governadora de última hora, vinte e quatro antes da votação da Câmara, na ânsia de simular o apoio que a pressa revelou ser um retrato da rendição.

quinta-feira, 7 de junho de 2012

Paralamas e Titãs: O Beco

Poroca: O Beco


José Carlos L. Poroca // Executivo do segmento shopping centers

jcporoca@uol.com.br

Dona Iraci recomendava o andar só ("antes só...") e distância nas discussões que envolvessem três temas palpitantes: política, futebol e religião. Havia outro assunto que recomendava cautela, pela complexidade e pelos mistérios em torno dele. Só direi que começa com a letra 'm', para evitar xingamentos de qualquer ordem a este cristão e, principalmente, à mulher do meu pai, que não merece qualquer tipo de ofensa por desejar o bem do filhote..

Aproveito o ensejo para pedir tardiamente desculpas a quem me deu carinho e atenção até o final da vida, seguindo a velha máxima "mãe é mãe, paca é paca..." e o resto fica por conta dos rimadores. Não segui as lições e vez ou outra descumpro as orientações maternas. Chego a acreditar que as recomendações se perderiam no tempo ou seriam, digamos, repaginadas, diante do que se vê nos dias atuais. Mesmo que não queira, estamos envolvidos com os três temas, às vezes até o pescoço, de forma direta ou pelas vias indiretas.

Não há como deixar de lado o "último desvio" ou passar a mão na cabeça do "corrupto da vez". Não dá para fechar os olhos para o caótico trânsito, para a (in)segurança de dia ou de noite, para as vias públicas mal cuidadas. Tudo é política e o cidadão, mesmo que queira ficar à margem, está inserido no contexto. Faço questão de não fazer referência a fato tal ou qual. É só abrir o jornal do dia ou a revista da semana para se conhecer de algo que exala mau cheiro.

Outro beco que requer pelo menos atenção, até porque há trechos mal iluminados, é aquele que envolve seitas, templos, salvação, etc. Do jeito que a coisa anda, logo, logo todo brasileiro precisará juntar um dote para salvar a pátria, perdão, a alma. Quem não tiver o dote, não deve nem entrar na fila; pelo contrário, deve ir preparando o leque e abano para passar a eternidade num quitinete de 12m², sem janela e sem ventilação, temperatura beirando a casa dos 50º C. De quebra, leva o "som", 24h por dia, daquilo que chamam de música: ai, se eu te pego...

O beco menos perigoso é o futebol, que, à exceção do Neymar, anda mal das pernas. É só não se envolver em demasia, achar que o nosso timezinho é um time de primeira ou afirmar que fulano - que joga no nosso time - é craque para seleção. Quem tem a pretensão de chegar lá precisa ter como espelho o Dr. Eduardo Gonçalves de Andrade, também conhecido como Tostão. Com a bola nos pés, passava por qualquer beco, estreito ou largo. Craque de bola e excepcional cronista. Acabou de publicar o livro "A perfeição não existe". Bom de bola, bom de letra.

A vida tem avenidas largas, ruas esburacadas e becos. Não dá para escolher: a avenida é larga com automóveis dos dois lados. Atravessá-la é ganhar meio caminho para a eternidade. As ruas esburacadas estão aí, oferecendo perigo ao pedestre ou aos que andam sobre rodas. Os becos são as alternativas para quem optar pelo caminho mais curto e aparente mais fácil. Curto e perigoso. Síntese (copiando Dona Iraci): se correr o bicho pega, se ficar o bicho pega e come.

quarta-feira, 6 de junho de 2012

Trabalho infantil

SEREJO: Um meu homônimo – Eloy de Souza

Por: Vicente Serejo

Na edição de 3 de março de 1954, em A República, Eloy de Souza publicou o artigo ‘Um meu homônimo’ sobre Jacinto Canela de Ferro, pseudônimo que adotou para assinar suas cartas sertanejas. Relembra uns dias que passou em Currais Novos a convite de Vivaldo Pereira, uma vaquejada em Santana do Matos, terras de Aristófanes Fernandes, e de como era feita a carne de sol naqueles sertões velhos. A transcrição é uma homenagem a Adriana Lucena que pesquisa sobre a iguaria nascida na civilização do calor para ser uma das mais perfeitas técnicas de conservação da mesa nordestina.

Vivaldo Pereira, jornalista nato e orador precavido e agradável, maneja a ironia com esperteza de letrado.

 Certa vez, ao proferir palavras de saudação numa vaquejada que me foi oferecida por Aristófanes Fernandes, anfitrião cuja medida no obsequiar consiste em não ter nenhuma, sintetizou os laços que me prendem aos sertanejos nas seguintes palavras de carinhosa gentileza: Eloy de Souza, pseudônimo de Jacinto Canela de Ferro…  Ele falava, realmente, a um mal nascido escritor regionalista que tinha vestido casaca e melhor vestira e ainda vestia gibão, guarda peito e perneiras de couro.  A ironia instantânea garantiu o êxito do discurso, que foi enorme, e deixou perplexo o político conterrâneo, de pernas moles pela emoção, felizmente amparado a um mourão da porteira de uma velha fazenda no município de Santana do Matos.

 Recordando o episódio, peço ao meu prezado amigo que também o recorde quando despertar no decorrer da noite pela música da chuva sobre as telhas da sua casa hospitaleira de Currais Novos.  Nada precisa responder sobre a carne-de-sol, a sapiência dos veterinários e o mais que consta de laudas antigas e passadas, que diziam assim.

 Todos os homens ilustrados que, de certo tempo a esta parte, passam pelo rancho do seu amigo, falam muito contra o uso constante da carne no sertão.  Vai nisto um grande erro. Há muitíssimos anos que o sertanejo quase que não come carne, nem de gado nem de ovelha, nem de bode.  Tanto a cabra como a ovelha, que por aqui chamamos criação ou miunça, estão se acabando por causa do avanço da agricultura do algodão; e assim sendo, o seu preço é tão caro que só os abastados podem comprá-la.  Mesmo a carne de cabra, que não vale nada como sustento, se vende pela hora da morte.

 Não fala a verdade, quem disser que carne de boi faz mal à gente.  Mal faz, e grande, não comê-la. Também no sertão essa perlenga entra por um ouvido e sai pelo outro.  Ninguém acredita nela e não há sertanejo que não se ria de tal besteira. O que todo mundo sabe, pelo exemplo, e pela tradição dos mais velhos, é que sem carne e sem tutano de corredor de boi, não existe homem forte, nem vida longa.

 Antigamente, quando o gado era muito e a carne barata, os sertanejos eram muito mais altos e tinham força dobrada. Dava gosto ver-lhes o lagarto do braço; e a largura do peito não tinha comparação com as titelas de hoje.

 Sou desse tempo e vi muito vaqueiro já idoso, pegar boi erado por um chifre, meter-lhe os dedos da mão desocupada pelos buracos da venta, apertar o mole que os divide e com uma reviravolta da cabeça, derrubá-lo mais depressa, do que não se consegue fazer, com um macaco de corda passado na cintura, moda introduzida no sertão pelos senhores veterinários, a respeito de quem pretendo falar mais adiante.

 A carne de boi que vai agora aos açougues, nem ao menos alegra a vista da gente, pela cor das postas e da gordura.  Uma deixou de ser encarnada e passou a roxa, e a outra perdeu aquele alaranjado de outrora e tornou-se quase parecida com a banha de tejuaçu, tudo isso obra do zebu.  Este bicho, que até parece de uma raça diferente, fortaleceu muito o gado crioulo e aumentou-lhe o peso e o valor. Até as vacas mestiças dão mais leite. Quanto, porém, à qualidade da carne, foi um desastre. Fresca ou de sol não se fez para a dentadura de velhos.  Os próprios moços quando topam com uma tora de chã de fora ou da volta da pá, cansam os queixos e acabam engolindo sempre uma parte que não foi mastigada.

 Desde que os fazendeiros, com o fim de conseguirem gado mais resistente às secas e mais pesado, começaram a castear as raças que os portugueses nos trouxeram nos seus barcos, como o zebu, nunca mais provamos carne de sol, verdadeiramente gostosa. Por outro lado a fome de ganhar dinheiro, acabou com essa especialidade do nosso sertão.  Em outros tempos, o seu preparo era uma habilidade que todo mundo não tinha.  Havia até homens conhecidos como tendo boa mão para salgar as mantas, empilhá-las e estendê-las nos caibros armados altos, sobre forquilhas.  Muitos não admitiam ajudantes. Somente eles despencavam quartos traseiros e dianteiros da rês, suspensos no alpendre da casa, ou em outro lugar sombreado. O sal era pilado muito fino, em pilão de aroeira, por braço de homem e não de mulher, criatura muito da cisma de alguns abridores de carne, que, quando estavam nesse trabalho, não gostavam que a nossa cara-metade passasse por perto, e muito menos tocassem nas mantas abertas ou por abrir.

 Estas depois de ficarem durante algum tempo, umas sobre as outras para embeber o sal, eram estendidas nos caibros já referidos e separadas por travessas que evitavam o contato de uma banda com a outra.  O cuidado em virá-las, de modo a que o sol beneficiasse igualmente os dois lados, era vigilante.

 A carne para ser chamada boa, precisava apanhar sereno, pelo menos durante duas noites. Alguns sertanejos mais antigos, e que sabiam apreciar um pedaço de carne de sol, davam-se ao trabalho de dobrar as mantas no devido tempo, e guardá-las em malas de couro cru, que eram, por assim dizer, a dispensa da carne de sol. Quando se abria uma dessas malas, na camarinha mais próxima da cozinha, o cheiro tresandava no alpendre e fazia água na boca dos que sentiam esse cheiro, muito mais ativo quando o pedaço da gordura da chã de fora e  do patinho estava chiando na brasa.  Nessa hora o fastio de quem estava doente acabava, pelo menos em pensamento, no desejo de comer um bocado, com farofa escaldada e tempero de cebolinha e coentro.

 Hoje o preceito de fazer a carne de sol acabou. Nem mesmo existe mais carne de sol. A que se vende hoje é de gado morto de tarde e retalhado no dia seguinte, com esse nome que merecia muito mais respeito, em honra à tradição do nosso paladar.  As mantas são grossas, cor de sangue, e tão salgadas que não há água fervendo que as escalde. A questão do marchante é o peso, que dá mais dinheiro, pouco lhe importando que o freguês goste ou não goste, viso que a competência por esse lado acabou, por acordo entre eles.

 Realmente, o cuidado com a criação é agora muito maior do que há algumas eras passadas. Hoje, há remédio contra o mal-triste, quarto inchado, o carbúnculo, só não há, pelo menos por aqui ainda não apareceu, contra a tal de aftosa moléstia que nos foi trazida do sul por desgraça nossa.

 De vez em quando somos visitados pelos veterinários, moços delicados, muito atenciosos e amigos de servir aos sertanejos. Tratam o gado com as vacinas que trazem, e eu reconheço que elas são boas para prevenir aqueles dois males terríveis.

 Velho caturra que sou, não deixo todavia, de achar muita graça na questão que eles fazem de ferver a agulha e a seringa e desinfetarem com creolina o lugar da injeção.  Cá para mim, a esse respeito, bicho não é gente para andar se infeccionando a toa. Deus já os fez com uma resistência muito grande às infecções.  Se não fosse assim, não haveria mais nem gado nem criação no sertão, onde não há bicho que pelo menor, não se espete uma e mais vezes todos os dias.  Mesmo espinho de xique-xique, que é reimoso como nenhum outro, mata o animal que nele se fere Se a parte do corpo ferida foi alguma junta da mão ou do pé, vem a inchação, que muitas vezes não desaparece e até aleija o animal. Porém matar nunca vi.

 O veterinário, entretanto, não está fazendo caso dessa resistência natural e faz questão de ferver a agulha e a seringa, o mais que pode, com perda de tempo, que também é dinheiro.

 Não deixei, igualmente de achar muita graça em certos remédios que eles aplicam para determinar moléstias.  Outro dia vi dar ao cavalo, que estava sofrendo de catarro, injeção de óleo canforado. Nós aqui pelo sertão em vez desse remédio que custa muito dinheiro, resolvemos o caso com um defumador de pimenta, falha de catingueira e fumo, que faz o animal espirrar até botar para fora grande parte do catarro que lhe entope as ventas e os gorgomilos.

 Os sertanejos muito mais antigos, os do tempo do onça, como se costuma dizer, empregavam um processo que consistia em meter na venta do cavalo doente, uma certa parte do corpo humano, secreta e por via de regra mal asseada, que produziria a mesma espirradeira e curava do mesmo modo.   Isso era, porém, puro abusão, que desapareceu na prática, mas ainda existe na tradição.

 Não sou contra os veterinários. Que Deus os traga em grande número com as  suas vacinas e a sua ambulância de remédios estrangeiros.  Eu, porém, não dispenso tal amargo, clister de semente verde de carrapateira branca; quando os meus cavalos aparecem com sangue, caso em que também costumo sangrá-los na veia do pescoço, ou mesmo no céu da boca.

 Noto que esta já está mais extensa do que devia ficando adiada a minha medicina dos bichos para outra vez.

Mudança climática pode custar à América Latina US$100 bilhões por ano

Marcelo Teixeira

Danos causados por mudanças climáticas podem custar à América Latina e a países do Caribe 100 bilhões de dólares por ano em 2050, caso as temperaturas médias subam 2 graus Celsius frente a níveis pré-industriais, segundo um estudo divulgado nesta terça-feira (5).

 A região é responsável por apenas 11% das emissões de gases estufa do mundo, mas é considerada particularmente vulnerável ao impacto de mudanças climáticas devido à sua posição geográfica e à dependência de recursos naturais, afirma relatório do Banco Interamericano de Desenvolvimento.

 O banco de desenvolvimento divulgou o estudo dias antes da Rio+20, conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) sediada no Brasil sobre desenvolvimento sustentável.

 O colapso do bioma de corais no Caribe, o desaparecimento de algumas geleiras nos Andes e algum grau de destruição na bacia Amazônica foram danos climáticos apontados pelo relatório.  

 A perda líquida de exportações agrícolas na região por conta das mudanças, por exemplo, deve ficar entre 30 bilhões e 52 bilhões de dólares em 2050.

 "Perdas dessa magnitude limitarão as opções de desenvolvimento assim como acesso a recursos naturais", afirma o relatório.

 Mas o bando ressaltou que o custo de ajudar países a se adaptarem aos efeitos das mudanças climáticas seria pequeno se comparado ao preço dos potenciais danos.       

 A instituição estima que cerca de 0,2% do Produto Interno Bruto da região, ou cerca de 10% dos custos dos impactos físicos, seriam necessários para apoiar a adaptação frente às mudanças.

 Segundo o texto, as emissões de gases estufa da região caíram 11% em relação ao início do século, para 4,7 bilhões de toneladas de dióxido de carbono equivalente em 2010.

 Apesar disso, o banco afirma que mais precisa ser feito na região. Os setores de transporte e energia devem aumentar suas participações nas emissões de gases em 50% até 2050, segundo o relatório.

 Estes dois setores apenas poderão contribuir com 2 bilhões de toneladas de dióxido de carbono equivalente por ano na região, segundo o estudo. Isso poderá elevar o total de emissões de gases estufas da região para 7 bilhões de toneladas até 2050, ou 9,3 toneladas de carbono per capita.

Trabalho Infantil no Brasil

 Escrito por Pablo Zevallos

 O trabalho infantil no Brasil ainda é um grande problema social. Milhares de crianças ainda deixam de ir à escola e ter seus direitos preservados, e trabalham desde a mais tenra idade na lavoura, campo, fábrica ou casas de família, muitos deles sem receber remuneração alguma. Hoje em dia, em torno de 4,8 milhões de crianças de adolescentes entre 5 e 17 anos estão trabalhando no Brasil, segundo PNAD 2007. Desse total, 1,2 milhão estão na faixa entre 5 e 13 anos.

 Matéria retirada do portal guiainfantil.com

Apesar de no Brasil, o trabalho infantil ser considerado ilegal para crianças e adolescentes entre 5 e 13 anos, a realidade continua sendo outra. Para adolescentes entre 14 e 15 anos, o trabalho é legal desde que na condição de aprendiz.

 O Peti (Programa de Erradicação ao Trabalho Infantil) vem trabalhando arduamente para erradicar o trabalho infantil. Infelizmente mesmo com todo o seu empenho, a previsão é de poder atender com seus projetos, cerca de 1,1 milhão de crianças e adolescentes trabalhadores, segundo acompanhamento do Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos). Do total de crianças e adolescentes atendidos, 3,7 milhões estarão de fora.

 Ao abandonarem a escola, ou terem que dividir o tempo entre a escola e o trabalho, o rendimento escolar dessas crianças é muito ruim, e serão sérias candidatas ao abandono escolar e consequentemente ao despreparo para o mercado de trabalho, tendo que aceitar sub-empregos e assim continuarem alimentando o ciclo de pobreza no Brasil.

Sabemos que hoje em dia, a inclusão digital (Infoinclusão) é de extrema importância. Além da conclusão do ciclo básico de educação, e da necessidade de cursos técnicos, e da continuidade nos estudos, o computador vem se tornando fundamental em qualquer área de trabalho.

Desde que entrou em prática, no final de novembro de 2005, o projeto de inclusão digital do governo federal, Computador para Todos - Projeto Cidadão Conectado registrou mais de 19 mil máquinas financiadas. Programas do Governo Federal juntamente com governos estaduais, pretendem instalar computadores e acesso a internet banda larga em todas escolas públicas até 2010. Com isso esperam que o acesso a informações contribuam para um melhor futuro às nossas crianças e adolescentes.

 Perfil do trabalho infantil no Brasil

Como já era de se esperar, o trabalho infantil ainda é predominantemente agrícola. Cerca de 36,5% das crianças estão em granjas, sítios e fazendas, 24,5% em lojas e fábricas. No Nordeste, 46,5% aparecem trabalhando em fazendas e sítios.

A Constituição Brasileira é clara: menores de 16 anos são proibidos de trabalhar, exceto como aprendizes e somente a partir dos 14. Não é o que vemos na televisão. Há dois pesos e duas medidas. Achamos um absurdo ver a exploração de crianças trabalhando nas lavouras de cana, carvoarias, quebrando pedras, deixando sequelas nessas vítimas indefesas, mas costumamos aplaudir crianças e bebês que tornam-se estrelas mirins em novelas, apresentações e comerciais.

A UNICEF declarou no Dia Mundial Contra o Trabalho Infantil (12 de junho) que os esforços para acabar com o trabalho infantil não serão bem sucedidos sem um trabalho conjunto para combater o tráfico de crianças e mulheres no interior dos países e entre fronteiras. No Dia Mundial contra o Trabalho Infantil, a UNICEF disse/referiu com base em estimativas que o tráfico de Seres humanos começa a aproximar-se do tráfico ilícito de armas e drogas.

Longe de casa ou num país estrangeiro, as crianças traficadas – desorientadas, sem documentos e excluídas de um ambiente que as proteja minimamente – podem ser obrigadas a entrar na prostituição, na servidão doméstica, no casamento precoce e contra a sua vontade, ou em trabalhos perigosos.

Embora não haja dados precisos sobre o tráfico de crianças, estima-se que haverá cerca de 1.2 milhões de crianças traficadas por ano.

terça-feira, 5 de junho de 2012

Amália Rodrigues - Medo

SEREJO: O medo pode entrar

Por: Vicente Serejo

Coisa medonha, Senhor Redator, é viver sem sossego. Quanto mais se o cristão escolheu para viver numa vila antiga, sem riqueza e sem soberba. É como se o medo nascesse dos becos e das ruas quietas e saísse andando como um fantasma do mal. É assim que vive o povo da Redinha nesses tempos de danações. É o que resta aos que moram nesta cidade tão bonita, entre o rio, o mar e os morros, numa sucessão de notícias que hoje fazem deste lugar do mundo um assombrado exercício de sobrevivência.

 Sou de outros tempos. De quando nas manhãs e tardes antigas seu povo pescava e pastorava as nuvens. Os alpendres eram uma extensão natural das casas, uma sombra doce que espantava o mormaço, e nas latadas as conversas ajudavam a viver. De uns anos hoje adocicados na lembrança com a fartura de peixes – das tainhas nas redes e dos xaréus que vinham ainda vivos no tresmalho do arrastão. A vida não chegava pela tevê, para fazer a paráfrase do verso bandeiriano, mas era vivida como se fosse poesia.

 Esta vila, Senhor Redator, que recebeu Mário de Andrade e Câmara Cascudo na velha casa de Barôncio Guerra, numa peixada homérica, servida com um zambê de côco dançado na beira da praia, teve verões imensos. Aqui o poeta Henrique Castriciano renovava os pulmões cheios de cavernas que anunciavam a morte com sua tuberculose. E o professor Antônio Soares, de olhos abertos para o céu e alma delirante, viu duas luas, um mistério tão grande que nem a Nasa, com toda ciência, conseguiu ver.

Ora, quem, senão uma vila assim, com o riso franco da vida sem perigo, por acaso teria um time com o nome de Morte Futebol Clube, e com a presença de um jovem craque chamado Lenine Pinto? E a gargalhada de Dalila que para Berilo Wanderley, e como aquelas irmãs Boninas, lá de Goianinha, eram corredores de ternura? E Cutruca, personagem de Newton Navarro que vencia suas ruas de areias alvas como as dunas cantando canções que ninguém entendia, como se viver fosse um jeito de amar os dias?

 E a Redinha que veio depois, e viveu em nós na sua última geração boêmia, como se fosse uma ilha a abrigar os deserdados da tristeza, de tão felizes? E as suas casas de janelas acesas pelo sol das manhãs? E as tardes, abertas para que a lua e as estrelas entrassem sem pedir licença? E a cachaça que ainda vi brilhando nas mesas, entre volutas de cajus vermelhos e abacaxis dourados, resplandecendo nos olhos mornos dos seus últimos boêmios? E a vida que, de tão íntima, não se sabia se um dia acabava?

 O medo hoje mora nestas ruas. Os dias de chuva não afagam com ternura de mãos aveludadas o rosto da gente. É perigoso, muito perigoso, tomar banho de chuva no beiral dos seus telhados. É arriscado andar nos becos desertos, bares e lugares. É desaconselhável abrir as portas e esperar a noite chegar. Foi-se o tempo, diria mesmo, que era bonito repetir o verso do poema de Mário da Silva Brito e para abrir as janelas para encher a casa de nuvens. Como, Senhor Redator, se o medo pode entrar?