Parece que tem sido muito difícil aos donos de
empresas hospitalares compreenderem, na sua essência, a natureza do negócio que
empreendem. Para eles, a menos que o façam por litigância de má fé – e neste
caso são passíveis de censura pública – a prestação de assistência a urgências
e emergências na área da saúde é igual a qualquer outro tipo de assistência
técnica. E que podem ou não, a seu juízo, de acordo com o livre arbítrio de
cada empresário e sem quaisquer direitos assegurados à sociedade.
Reincidentes, tentaram uma primeira vez a
greve patronal sem qualquer observância das leis que regulam esse tipo de
decisão. Como se fossem livres para movimentos paredistas acima de toda a força
conceitual do crime de omissão de socorro. Mesmo compelidos a manterem suas
portas abertas por decisão da Justiça, tentaram outra vez, agora arrimados numa
fixação de prazo com antecedência, convencidos de que desta feita seria fácil
driblar a norma legal, agora com feia e abusiva transgressão.
Os hospitais são estruturas juridicamente
híbridas nas relações com a Unimed. Dentro deles, na condição de sócios e
dirigentes, estão médicos que também são sócios da cooperativa e, portanto,
eleitores de suas decisões plenárias com acesso a todas as informações. Como
sabem, quando sentam à mesa de seus gabinetes hospitalares, que a Unimed
representa em média nada menos de cinquenta por cento do faturamento, o que por
si só garante uma magnitude que só pode ser negada como pressão.
Mais: seus clientes pagam suas mensalidades,
sem direito a voz e a voto, sob pena de suspensão automática da prestação de
serviço no prazo contratual. Ora, por mais leonino que possa ser quando se
fecha ao voto e à voz dos que pagam, não pode ser unilateral a ponto de
qualquer parceiro suspender o atendimento com a justificativa de um simples
aviso e como se a sociedade não fosse regida por leis e essas leis cuidassem
apenas de preservar a saúde financeira de uns contra a saúde da vida de outros.
Não se nega que as negociações entre a Unimed
e os hospitais se arrastam e que estes merecem ter os seus serviços
corretamente remunerados. Mas, daí a se permitir que vidas humanas venham a ser
usadas como buchas de canhão das empresas hospitalares, pressionando uma
cooperativa que também é deles, médicos, seria aceitar o caos como prumo e fio
de conduta. Não, não é assim que os parceiros devem conduzir suas relações, num
melancólico espetáculo de transgressões que beiram o cinismo.
Não queiram os donos de hospitais que a
sociedade livre e democrática aceite a reencarnação de Frederico II, o déspota
louco da Prússia na escuridão do século dezoito. Aquele que ao construir seu
castelo incomodou-se diante de um moinho que impedia a visão da bela paisagem
do alto das ameias e, irritado, quis comprá-lo ao proprietário que não aceitou
vender por ser uma velha tradição de família, de geração a geração. Ameaçado de
destruição, respondeu sem ter medo: ‘Ainda há juízes em Berlim’
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