sexta-feira, 31 de agosto de 2012
Serejo: O que é a natureza
Por:
Vicente Serejo
Veja
Senhor Redator, o que é a natureza. Enquanto a cada dia vou tendo mais certeza
de que a minha nova frustração é não ter sido pastor evangélico e dono de uma
igreja, dessas que preparam as almas deste mundo para o mistério dos últimos
dias, vejo que a prefeita Micarla de Souza não gostou nem um pouco do que
noticiou a revista Época. Certo, inventou. Afinal não é verdade. Mas se fosse,
que de mal teria, se hoje há tantas igrejas cuidando dos nossos pecados nesse
mundo de meu Deus?
Não
discordo do cuidado das pessoas que exercem a vida pública contra as falsas
notícias que nascem não se sabe de onde e ficam andando por ai. Confesso que
até nesse sentido já fui muito mais radical. Hoje compreendo melhor a maldade
humana. Mais jovem, reagia a tudo prontamente. Adorava provocar e ser
provocado. Com o tempo, fui relevando tudo. A idade ensina a gente a pesar e
sopesar as misérias e grandezas da carne humana como se a alma fosse morar
separada, num lugar distante.
Sim,
voltando à vaca fria, hoje seria um pastor. Não seria santo, daquela santidade
que de tão falsa chega a ser antipática. De uma santidade mediana, suportável
como artifício. De preferência, com um leve toque de magia se por acaso
faltasse um certo ar de misticismo. E pregaria na minha igreja as profecias dos
últimos dias até por acreditar que o mundo anda perto de se acabar. Se não
sucumbiu em sessenta e se resistiu a tantos cataclismos, desses tempos de hoje,
tenho impressão, não vai passar.
Modéstia
parte, Senhor Redator, não teria tanta dificuldade assim em subir ao púlpito,
como os novos pregadores. E de braços abertos alertar as poucas almas que lá
estivessem do perigo da soberba nesse mundo de danações. Principalmente do
veneno que é a falsa bondade, aquela que esconde toda a vaidade do mundo. Faria
orações fortes e poderosas para afugentar os falsos humildes que na calada da
noite e nos lugares mais escondidos da alma colecionam troféus na avareza da
incurável vaidade.
Hoje
vejo que foi bobagem minha, naqueles dias de juventude, discordar da força da
expressão como ungüento, cataplasma e curativo para todas as feridas que a vida
vai abrindo como chagas na carne da gente. Nem liguei. Dei tudo por visto e
ouvido, e segui. Faltou acreditar na eloqüência da palavra, na força dos
gestos, na magia do drama, na chama do riso que incendeia a comédia. E fiquei
aqui a insistir na tolice de consertar o mundo ao invés de fazer do medo a boa
moeda da gratidão.
Ora,
Senhor Redator, nunca imaginei descobrir que os padres fossem homens tão comuns
e tão parecidos com os pecadores. Há quem veja nesta descoberta um pobre homem
de pouca fé e de olhos caídos nas águas da blasfêmia. E, no entanto, aqui está
um velho devoto de Nossa Senhora da Conceição que justamente por tê-la assim,
como uma grande mãe, deixou de ser um pastor de almas com medo do pecado. Numa
pequena igreja de subúrbio, anônimo e feliz, como se fosse um santo.
YANOMAMI: ONGs relatam massacre de até 80 indígenas
30
de agosto de 2012 | 3h 09
CARACAS - O Estado de S.Paulo
A emissora britânica informou que os ativistas pelos direitos dos ianomâmis que atuam na região amazônica já haviam relatado, recentemente, que mineiros ilegais vinham fazendo ameaças aos indígenas e praticando violência contra as comunidades da região
CARACAS - O Estado de S.Paulo
Organizações
não governamentais de defesa dos direitos dos indígenas que atuam na Venezuela
denunciaram ontem que mineiros mataram até 80 ianomâmis na região da fronteira
venezuelana com o Brasil. As informações são da emissora britânica BBC.
O
ataque, de acordo com os relatos, ocorreu no mês passado, na comunidade de
Irothatheri, localizada nas proximidades do território brasileiro.
Testemunhas
que estiveram no local da matança afirmaram que os mineiros atearam fogo a uma
casa comunal dos indígenas, pois encontraram os corpos dos ianomâmis
carbonizados ao passar pela tribo.
Membros
da comunidade indígena têm reclamado de mineiros invadindo suas terras à busca
de ouro.
Segundo
a ONG Survival International, a demora na descoberta do massacre ocorreu em virtude
da remota localização da tribo atacada. A entidade afirmou que as pessoas que
descobriram os corpos levaram vários dias para caminhar até a localidade mais
próxima.
Organizações
de defesa dos ianomâmis afirmaram ter encontrado três sobreviventes e pediram,
em um documento dirigido ao governo venezuelano, que Caracas investigue a
matança e colabore com o Brasil no "controle e vigilância" de
mineiros na região ocupada pelos indígenas.
"Todos
os governos com terras na Amazônia devem impedir a mineração ilegal
desenfreada, a extração de madeira e os assentamentos nos territórios
indígenas", afirmou à BBC Stephen Corry, diretor da Survival
International.
A emissora britânica informou que os ativistas pelos direitos dos ianomâmis que atuam na região amazônica já haviam relatado, recentemente, que mineiros ilegais vinham fazendo ameaças aos indígenas e praticando violência contra as comunidades da região
Governo faz concessões a ruralistas em lei florestal
Mudança
permitirá replantio menor de áreas desmatadas em beira de rio
Para
aprovar medida provisória em comissão, Planalto cede de novo à bancada de
grandes proprietários de terra.
DE
BRASÍLIA
Após
20 dias de debates e novas concessões do governo à bancada ruralista, o
Congresso aprovou ontem em comissão mista o relatório da MP (medida provisória)
do Código Florestal.
A
MP foi enviada ao Legislativo pela presidente Dilma como um complemento aos
vetos feitos por ela ao projeto de código aprovado antes.
A
medida, que vence em 8 de outubro, segue agora para a Câmara dos Deputados e,
depois, para o Senado. Novas disputas em torno do teor da lei ainda podem
surgir.
As
cessões do governo ocorreram no ponto que mais causou polêmica durante a
tramitação anterior da norma ambiental no Congresso: a recuperação de APPs
(áreas de preservação permanente) desmatadas em beira de rios.
Se
aprovadas ao final do processo legislativo, as mudanças de ontem permitirão
recuperações menores.
REDUÇÕES
A
comissão mista -formada por deputados e senadores- aprovou que, em fazendas de
tamanho médio com rios de até dez metros de largura, deverão ser replantados 15
metros a partir das margens. A previsão original era, grosso modo, de 20
metros.
Segundo
a decisão de ontem, se o rio dentro desse mesmo tipo de propriedade tiver mais
de dez metros de largura, a recuperação mínima deverá ser de 20 metros e a
máxima de 100 metros, a depender da largura do rio. Antes, esses valores
variavam de 30 metros a 100 metros.
Para
grandes fazendas, serão sempre replantados entre 20 metros e 100 metros, a
partir da beira e de modo proporcional à largura do rio. Antes, a determinação
era de recuperar entre 30 m e 100 m.
Por
outro lado, governistas impediram uma alteração mais radical, de interesse dos
ruralistas: a que acabava com qualquer proteção permanente nas matas de margens
dos rios intermitentes (com períodos de seca no ano).
MP do Código Florestal aprovada em comissão mista beneficia ruralistas
DENISE
MADUEÑO / BRASÍLIA - O Estado de S.Paulo
A
comissão especial do Congresso aprovou ontem a medida provisória do Código
Florestal, com alterações que beneficiam as médias e grandes propriedades
rurais.
Foi
reduzida a área mínima obrigatória de recuperação de vegetação às margens dos
rios desmatadas ilegalmente. Como queriam os ruralistas, a mudança também
remeteu para o Plano de Regularização Ambiental (PRA) a delimitação de áreas de
recuperação, mantidos os parâmetros mínimos e máximos definidos pela União.
Essa decisão fica a cargo de cada Estado - hoje ela é compartilhada entre
municípios, Estados e governo federal.
A
mudança na área a ser recuperada era pedida pelos ruralistas desde que a MP foi
para a avaliação da comissão mista. Sem conseguir emplacá-la no texto do
relator, senador Luiz Henrique da Silveira (PMDB-SC), eles acabaram forçando
uma medida considerada por ambientalistas como um "bode na sala".
No
início do mês, quando a votação da comissão recomeçou, os ruralistas
conseguiram aprovar uma emenda que tirava a proteção dos rios intermitentes
(temporários), resguardando apenas os perenes. A medida foi considerada
catastrófica por colocar em risco a sobrevivência desses rios. Havia estimativas
extraoficiais de que ficariam sem proteção em torno de 50% dos rios
brasileiros.
Agora
os ruralistas aceitaram voltar atrás nessa decisão em troca de obter uma
redução nas obrigações de recuperação. Continuaram desprotegidos, porém, o que
foi chamado de cursos de água efêmeros, considerados os que surgem com as
fortes chuvas, mas que não fluem como rios durante o ano.
As
negociações entre governo, ruralistas e ambientalistas prorrogaram a reunião
por seis horas. Luiz Henrique apresentou um novo texto fora das regras
regimentais. Dessa forma, apenas um consenso permitiria sua votação. Os
deputados Ronaldo Caiado (DEM-GO) e Abelardo Lupion (DEM-PR) eram os mais
resistentes. Quando o texto foi aprovado por unanimidade, ruralistas
comemoraram.
Segundo
deputados da bancada agropecuária, com esse entendimento, a MP deverá ter uma
aprovação tranquila no plenário da Câmara, na próxima semana, e no do Senado,
na segunda semana de setembro, quando as duas Casas estarão trabalhando durante
o recesso branco do período eleitoral. Um atraso nesse calendário compromete a
MP, que expira em 8 de outubro.
Pelo
texto aprovado, em rios de até 10 metros de largura em propriedades médias, de
4 a 15 módulos fiscais, a recomposição de áreas desmatadas será de 15 metros
contados da borda da calha do leito regular. Nos outros casos, com rios de
qualquer largura, em propriedades acima de 15 módulos fiscais, a definição da
área de recuperação foi remetida ao Plano de Regularização Ambiental,
respeitado o parâmetro de, no mínimo, 20 metros e, no máximo, 100 metros,
contados do início da margem.
Na
MP, a exigência era maior. Para propriedades de 4 a 10 módulos fiscais, 20
metros e, imóveis acima de 10 módulos fiscais, o mínimo de 30 metros e o máximo
de 100 metros. Para imóveis menores, ficou mantida a exigência de 8 metros até
2 módulos, e de 15 metros até 4 módulos.
O
relator da MP fez outra mudança no texto de ontem, atendendo à pressão dos
ruralistas, principalmente de Tocantins e Mato Grosso, Estados da Amazônia
Legal. A mudança reduziu a área de recomposição no Cerrado amazônico, que
passou a ser beneficiada com a regra que limita em 25% o total do imóvel para
recuperação da vegetação, no caso de médias propriedades. Toda a Amazônia Legal
seguia regras mais rígidas. Com a mudança, apenas áreas de florestas da
Amazônia Legal ficam excluídas do limite de 25%.
Para
técnicos do Ministério do Meio Ambiente, o "equilíbrio entre social e
ambiental que havia na MP" está ameaçado, assim como a segurança jurídica.
/ COLABOROU GIOVANA GIRARDI
quinta-feira, 30 de agosto de 2012
Serejo: O verde secou
Por:
Vicente Serejo
Não
será apenas de orfandade – e já seria muito – o papel do Partido Verde nas
eleições municipais deste ano. Aquele mesmo que há quatro anos, puxado pelo
fenômeno populista da hoje prefeita Micarla de Souza, não só conquistou a
simpatia do eleitorado natalense como arrebatou das mãos de um acordão de
caciques uma vitória imaginada em Brasília que reunia adversários em torno não
de uma luta política, mas feita para agradar à candidatura da deputada petista
Fátima Bezerra, ungida pelo Palácio do Planalto.
O
acordão, de tão espúrio, o acabou punido nas urnas logo no primeiro turno, mas
estranhamente nada sofreram seus signatários. Pelo contrário. A governadora
Rosalba Ciarlini teve o apoio da prefeita eleita como reciprocidade; Garibaldi
Filho é ministro; Henrique Alves líder nacional do PMDB e forte no Palácio do
Planalto; José Agripino continuou senador; Fátima Bezerra, a candidata
derrotada, com seu mandato de deputada federal e Micarla de Souza assumiu a
Prefeitura como se fosse uma nova líder.
Até
mesmo aquele que saiu derrotado das urnas, e autor do acordão, o ex-prefeito
Carlos Eduardo Alves, acabaria sendo beneficiado com a derrocada da gestão
Micarla, mas sem que se lhe possa negar o mérito de ter resistido sem aderir ao
governo Rosalba Ciarlini. Manteve seu PDT eqüidistante de novos acordos e assim
lidera as pesquisas pelo menos há três anos. Além de ter reunido em torno de
sua luta todos adversários antigos e novos da governadora e prefeita, como
Wilma de Faria e Robinson Faria.
Ninguém
pode afirmar que o desastre da gestão Micarla de Souza sepulta a sua carreira
política. Mas os números da pesquisa demonstram que o natalense,
independentemente do preparo ou da postura dos outros candidatos, não querem
arriscar novas experiências. A clara preferência pela candidatura de Carlos
Eduardo em todos os segmentos – idade, grau de instrução e faixa econômica –
revelam o temor hoje fixado no sentimento do eleitor com seus claros sinais de
cristalização que as pesquisas atestam.
Além
de outra verdade que não poderá ser escondida: os candidatos do PMDB e PSDB/DEM
são dois nomes qualificados nos quadros dos seus partidos, mas é como se a eles
faltasse uma autenticidade indispensável. Chegaram às ruas como arranjos
partidários improvisados, como justificativas perfeitas para um jogo que
precisa ser travado como selo de garantia de um jogo maior que se trava no
âmbito de Brasília. O PMDB para mostrar coerência e o DEM para manter o faz de
conta de uma falsa resistência.
São
poucas as chances dos adversários do ex-prefeito Carlos Eduardo Alves. Até por
uma verdade quase que dialética: sua candidatura não foi construída pela força
do PDT ou de sua habilidade política. Nasceu como efeito natural do desastre
que se abateu sobre a gestão Micarla de Souza, hoje órfã do seu próprio partido
que se desfaz em adesões, sem discurso e sem postura, a procura de alguns
poucos lugares nas poltronas da Câmara. Um fim melancólico para um partido que
parecia ser o verde da renovação.
Organizações indígenas venezuelanas denunciam novo genocídio de Yanomami por garimpeiros brasileiros
O
relato está baseado no depoimento de três sobreviventes, que estavam na
floresta no momento do ataque dos garimpeiros contra a casa coletiva da
comunidade Irotatheri, na fronteira do Brasil com a Venezuela. O número de
mortos ainda é incerto
Depois
de 20 anos do massacre realizado por garimpeiros brasileiros contra os
Yanomami, no caso conhecido como Massacre de Haximú, três sobreviventes relatam
nova barbárie ocorrida em julho deste ano em território venezuelano
A
Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia (Coiam), que congrega 13
organizações indígenas da Amazônia Venezuelana, divulgou nesta segunda-feira
(28), documento baseado no relato de sobreviventes Yanomami, da comunidade
Irotatheri, localizada nas cabeceiras do Rio Ocamo, na fronteira do Brasil com
a Venezuela. O relao dá conta de que garimpeiros cercaram a casa coletiva e
dispararam contra eles, posteriormente ateando fogo à casa. Os sobreviventes
estavam na floresta no momento do ataque. O número de mortos ainda é incerto.
O
documento faz referências ás frequentes denúncias dos Yanomami, que têm sido
feitas desde 2009 aos diversos órgãos do Estado Venezuelano, sobre a crescente
invasão garimpeira e o consequente aumento da violência entre os garimpeiros e
os índios. Violência física, ameaças e a contaminação da água por uso de
mercúrio causando a morte de vários Yanomami são alguns dos exemplos citados.
No
Brasil, a Hutukara Associação Yanomami (HAY) e o ISA vem alertando para o
aumento do garimpo ilegal no território Yanomami , impulsionado pela alta do
preço do ouro no mercado internacional. Soma-se a isso ainda a insuficiência
das ações governamentais para coibir o garimpo, gerando um recrudescimento da
violência entre garimpeiros e os Yanomami, que podeira resultar em um novo
massacre de Haximu (saiba mais).
As
operações de repressão ao garimpo em Terra Indígena Yanomami aumentaram no
Brasil nos últimos dois anos. Em julho último, a Operação Xawara teve como foco
a prisão de empresários do garimpo e de não garimpeiros, com resultados mais
positivos em relação às ações de combate ocorridas até então. No entanto, estas
medidas não foram suficientes para impedir a escalada da violência entre o povo
Yanomami e os garimpeiros. Para tanto, é necessário continuar combatendo os empresários
do garimpo em uma ação de cooperação binacional, que considere a participação
dos Yanomami.
O
documento da Coiam solicita ao governo da Venezuela que realize uma
investigação urgente, além de adotar medidas bilaterais com o Brasil para
controlar e vigiar a entrada de garimpeiros no município de Alto Ocamo, local
do massacre. As organizações signatárias do documento lembram ainda que a
omissão de investigar e tomar medidas eficazes, como no caso de Haximu em 1993,
poderia compromenter a responsabilidade internacional do Estado Venezuelano,
por permitir que agentes externos agridam os venezuelanos, no caso os Yanomami,
em seu próprio território.
PRONUNCIAMIENTO DE LAS ORGANIZACIONES INDÍGENAS DEL ESTADO AMAZONAS
(COIAM)
sobre la nueva MASACRE DE INDÍGENAS YANOMAMI en la Comunidad IROTATHERI cometida
por mineros ilegales brasileños.
En
el día de 27 de Agosto de 2012, nosotros, pueblos y comunidades indígenas de la
Amazonía venezolana,
agrupados en la
Coordinación de Organizaciones Indígenas
de Amazonas (COIAM), representados por la Organización Regional de
Pueblos Indígenas de Amazonas
(ORPIA), la Organización
Indígena Piaroa Unidos
del Sipapo (OIPUS),
la Organización Ye´kuana del
Alto Ventuari (KUYUNU),
la Organización Indígena
Jivi Kalievirrinae (OPIJKA), la
Organización Yanomami (HORONAMI), la
Organización Mujeres Indígenas de Amazonas (OMIDA), la Organización de
Comunidades indígenas Huôttuja del Sector
Parhuaza (OCIUSPA), la
Asociación de Maestros
Piaroa (Madoya Huarijja),
La Organización Piaroa del
Cataniapo “Reyö Aje”,
la Organización Indígena
de Río Negro (UCIABYRN), la
Organización Piaroa de
Manapiare, la Organización Ye´kuana
del Alto Orinoco (KUYUJANI
Originario), el Movimiento
Político Pueblo Unido
Multiétnico de Amazonas (PUAMA),
reunidos en Puerto
Ayacucho, queremos realizar
el siguiente
pronunciamiento sobre
la NUEVA MASACRE
DE INDÍGENAS YANOMAMI ocurrida en la comunidad
IROTATHERI, Municipio Alto Orinoco, cometida por mineros ilegales provenientes de
Brasil y cuya información fue suministrada por sobrevivientes y testigos
durante el mes de agosto de 2012:
HORONAMI, quien
ha sido víctima
en el mes
de julio 2012,
de una NUEVA MASACRE OCURRIDA EN
LA COMUNIDAD IROTATHERI,
ubicada en las
cabeceras del río
Ocamo, Municipio Alto Orinoco
y área de influencia de varias comunidades
Yanomami como son MOMOI,
HOKOMAWE, USHISHIWE y
TORAPIWEI, las cuales
vienen siendo agredidas
e invadidas por mineros ilegales provenientes de Brasil (GARIMPEIROS)
desde hace más de 04 años.
2.- Lamentamos
profundamente este nuevo
ataque violento contra
el pueblo Yanomami, en
el cual habría
muerto un número indeterminado
de personas, con
03 sobrevivientes en una comunidad (shapono) de aproximadamente 80
indígenas Yanomami en el Alto Ocamo, la cual fue quemada y agredida con armas de fuego y
explosivos según testimonios de los sobrevivientes y testigos que se
trasladaron a la comunidad de Parima “B” entre el 15 y el 20 de agosto de 2012,
donde trasmitieron el trágico testimonio a miembros de la organización HORONAMI
y autoridades venezolanas de la 52 Brigada del Ejército y el Centro Amazónico
de Investigación y Control de Enfermedades Tropicales (CAICET).
3.-
Expresamos nuestra preocupación
debido a que
desde el año
2009, se viene informado a varios
órganos del Estado venezolano sobre la presencia de GARIMPEIROS en el Alto
Ocamo y sobre diversas agresiones contra
las comunidades de MOMOI y HOKOMAWE quienes fueron víctimas de violencia
física, amenazas, uso de mujeres y contaminación del agua por mercurio con
saldo de varios Yanomami muertos y sin haber
TOMADO MEDIDAS EFECTIVAS PARA DESALOJAR A LOS GARIMPEIROS DE LA ZONA y
diseñar un plan de control y vigilancia sobre su entrada cíclica en la zona, en
momentos en que hay reportes del aumento de la actividad minera ilegal en toda
la Amazonía brasileña.
4.-
Esta situación no sólo afecta los derechos a la VIDA, LA INTEGRIDAD FÍSICA y LA
SALUD DEL PUEBLO
YANOMAMI, sino que
constituye un nuevo
genocidio y una
nueva amenaza a la sobrevivencia física y cultural de los Yanomami, en
un momento en que se cumplen en el
año 2013, veinte
(20) años de
la Masacre de
HAXIMÚ en la
que fueron asesinados 16 mujeres,
niños y ancianos.
5.-
Solicitamos al Gobierno Nacional y a los demás órganos del Estado venezolano la
realización de una INVESTIGACIÓN JUDICIAL URGENTE, el TRASLADO INMEDIATO HASTA
EL LUGAR DE LOS
HECHOS y LA
ADOPCIÓN DE MEDIDAS
BILATERALES CON BRASIL para controlar y vigilar la entrada de
garimpeiros en el ALTO OCAMO, lugar de la masacre y con presencia de
Yanomami amenazados por
la acción incontrolada
de mineros ilegales (garimpeiros). Recordamos que la
omisión de investigar y tomar medidas eficaces como en el caso de
HAXIMÚ, podría comprometer
la responsabilidad internacional
del Estado venezolano, por
permitir que agentes
externos agredan a
nacionales venezolanos en su territorio.
Organización
Regional de Pueblos Indígenas de Amazonas (ORPIA)
Organización
Indígena Piaroa Unidos del Sipapo (OIPUS)Organización Ye´kuana del Alto Ventuari (KUYUNU)
Organización Indígena Jivi Kalievirrinae (OPIJKA)
Organización Yanomami (HORONAMI)
Organización Mujeres Indígenas de Amazonas (OMIDA)
Organización de Comunidades indígenas Huôttuja del Sector Parhuaza (OCIUSPA)
Asociación de Maestros Piaroa (Madoya Huarijja)
Organización Yekuana del Alto Orinoco (KUYUJANI Originario)
Organización Piaroa del Cataniapo “Reyö Aje”
Organización Indígena de Río Negro (UCIABYRN)
Organización Piaroa de Manapiare,Organización Yabarana del Parucito (OIYAPAM)
Movimiento Político Pueblo Unido Multiétnico de Amazonas (PUAMA)
José
Gregorio Díaz Mirabal
Vice-Coordinador
CONIVE
Guillermo
Guevara
(Constituyente
Indígena 1999)quarta-feira, 29 de agosto de 2012
Serejo: meu irmão Iaponan
Por: Vicente Serejo
Neste
19 de julho, perdi meu irmão, primogênito do meu pai, Iaponan Soares de Araújo,
após uma longa enfermidade. Ele nascera em São Vicente em 26 de novembro de
1936 onde fez seus primeiros estudos tendo sua mãe Milka como professora. Foi
estudar no Colégio Diocesano de Caicó e com a nossa transferência para Natal,
foi pro Ateneu. Ingressando nos quadros
técnicos do DNER, foi transferido para o Paraná e depois para Santa Catarina,
quando no Governo de Juscelino Kubitschek se implantava a grande BR-101.
Em
Florianópolis, conheceu e casou com Vera Nocetti de Araújo, talvez e
coincidentemente do mesmo Araujo da nossa família, pois seu pai, seu Victor,
dizia-nos que sua família viera do Nordeste brasileiro, para o sul, fugindo da
seca de 1877. Iaponan formou-se em
Pedagogia e História em Santa Catarina com pós-graduação em administração e
gestão de arquivos. Foi Secretário de Estado da Cultura de Santa Catarina na
gestão de Espiridião Amin e Presidente da Fundação Catarinense de Cultura.
Aposentado,
criou e dirigia o Museu da poesia manuscrita e mantinha um grande acervo
literário, notadamente dos escritores potiguares.
Fôra
condecorado com as medalhas culturais dos governos do Rio Grande do Norte e
Santa Catarina.
Membro
da Academia Catarinense de Letras, Iaponan publicou diversos livros, a maioria
na área da crítica literária e do resgate histórico de intelectuais e artistas
catarinenses. Sua bibliografia inclui: Ernani Rosas (1965), Marcolino Antonio
Dutra (1970), Panorama do Conto Catarinense (2ª. edição), 1974, A poesia de
Oscar Rosas, Três narrativas da insônia (contos), 1977, Arquivos e documentos
de Santa Catarina (1985), Vamos conhecer Biguaçu (1985) e Poesia de Ernani Rosas
(1989).
Iaponan
teve com Vera os filhos Maria Raquel, Débora, Joaquim, Valéria e Juliana que
lhe deram sete netos.
É
mais um fragmento nosso que se despedaça, deixando-nos menores e mais frágeis.
Não temos a grandeza de Maria, a menina de Nazaré que cantava “exultai o meu
espírito em Deus meu salvador”, diante do mistério da vida, mas procuramos um
consolo diante do mistério da morte.
Mesmo
meditando nas palavras do poeta que afirmava que “para isso nós fomos feitos…”
é difícil aceitar a perda e consolar a dor da saudade.
“Meu filho, cheire o arroz”
Joca Souza Leão
Jocasouzaleao@gmail.com
Eu era o
cheirador oficial da família. Foi, não foi, minha mãe pedia pr’eu cheirar o
arroz, pra ver se tinha azedado na geladeira. Se dissesse que tava bom, a
cozinheira dava uma escaldada e tudo bem, ia ser o arroz do almoço. Mas se dissesse
que tava azedo, ela fazia outro na hora. E o azedinho ia virar arroz-doce pro
jantar, feito com leite de coco e polvilhado com canela. Apesar de tarado por
arroz-doce, nunca menti. Se dissesse que tava azedo, era porque tava – que eu
não ia pôr em risco minha fama e prestígio.
Meu
pai registrava com certo orgulho – e se atribuindo parte dos méritos – qu’eu
tinha herdado dele o rinencéfalo (anos depois, meu irmão médico, Caio,
esclareceu que se tratava da área do cérebro responsável pelo olfato). Cheirar
era comigo mesmo. Perfume forte e doce, ainda que bom, dava dor de cabeça. Se
fosse vagabundo, então... Eu era capaz de lembrar lugares e pessoas pelo
cheiro. E ainda sou. Pro bem e pro mal.
Naquele
tempo (e ainda hoje, acho), catinga era palavra de mau gosto – se não chula,
cafona. Gente bem e educada não falava catinga. Nem fedor. Falava mau cheiro. Apesar de Gilberto Freyre, muitos anos antes, em Casa
Grande &
Senzala, dizer que “catinga” não era mais palavra com “sabor arrevesado do
exótico” e que os menos puristas “já não têm, como outrora, vergonha de
empregá-la”, ali estava o cerne da
questão. Preconceito. Catinga é palavra de origem africana. Negra e pobre,
portanto. Mas na minha cabeça de menino, o preconceito ganhara significados. E
graduações. Mau cheiro, fedor e catinga. Na escala, de mal a pior.
Assim, minhas lembranças de infância têm
cheiros – não fedores nem catingas. No máximo, o azedinho do arroz. Naquele
tempo, o Recife cheirava. Dependendo da fruta da época e de onde se estivesse, cheiro
de manga (cada qual tinha seu cheiro: rosa, espada, itamaracá – que a gente
comia de colher –, manguito e jasmim), goiaba, jaca, cajá, caju (antes do
fruto, o cheiro da flor), mangaba, pitanga, graviola e sapoti. Espinheiro e
Graças, cada rua tinha um cheiro. Casa Forte tinha outros. Apipucos e Dois
Irmãos tinham todos. Cordeiro e Várzea, cheiros do interior, de mato e vacarias.
Boa Viagem, cheiro de brisa, de maresia, salgadinho. A Rua da Aurora, docinho,
de chocolate da Renda & Priori. Imperial, café, das duas torrefações que
havia lá. A Matias de Albuquerque, esquina com Pedro Ivo, maçã e pera. A Dantas
Barreto, bacalhau (que eu gostava, creio, porque já antecipava o cheiro do
bacalhau-de-coco lá de casa). Livramento, tecidos de algodão. Duque de Caxias,
couro de sapato novo. O Bairro do Recife, biscoito, açúcar e mar.
Havia
uma água-de-colônia (alemã, acho eu agora) que tinha no rótulo a gravura de uma
mulher com chapéu e leque. Eu achava que a mulher do rótulo era Dona Lucila,
casada com Dr. Oscar Coutinho, pois ela tinha o cheiro dessa água-de-colônia e
também usava chapéu e leque. Da minha primeira vez, lembro mais dos cheiros do
que da mulher. O cheiro da pensão, do quarto, do perfume forte, do sexo.
Provação – da qual me sai com relativo sucesso. Minha primeira namorada usava
Bond Street. A segunda, Fleur de Rocaille. Pouquinho. Nos punhos e atrás das
orelhas. Gostava de ver o jeito dela esfregar um punho no outro e do trejeito
com a cabeça para afastar o cabelo que lhe encobria as orelhas. “Não se usa
perfume na roupa” – aprendi com ela.
“Sei
de onde vens, sei por onde andaste. / Vens dos subúrbios distantes, dos sítios
aromáticos / Onde as mangueiras florescem, onde há cajus e mangabas (...)” – o
poeta Joaquim Cardozo sabia de onde vinha a “Chuva do Caju”. Dos sítios
aromáticos. Vinha, não vem mais. Com
ela, o Recife cheirava. Não cheira mais.
– Saudade?
– E apois!
Quem tem medo dos emigrantes ?
Por
Rui Martins, de Genebra
Emigrantes
querem um órgão institucional sem tutela.
O
Conselho dos Emigrantes não funcionou por falha fundamental de criação: ele
deveria ser uma simples e curta transição para o órgão emigrante sem a tutela
do Itamaraty.
Quando
terminei a cobertura do Festival de Cinema de Locarno e abri, no Facebook, a
página da Secretaria de Estado dos Emigrantes, tive a surpresa de ver
desaparecerem todas as postagens ali existentes desde sua criação.
Pedi
o apoio de um informático e soube que o grupo fora alvo de um ataque por
hackers. Como sou analfabeto em matéria de informática, entreguei ao
especialista a tarefa de evitar que o grupo fosse exterminado – são cerca de
1300 membros que não teriam mais informações sobre o projeto em favor de uma
Secretaria dos Emigrantes sem a tutela do Itamaraty.
Estou
retomando a administração do grupo, e me pergunto se esse simples esforço de
informação seria tão importante para mobilizar pessoas interessadas em evitar a
divulgação de um projeto em favor dos emigrantes.
Como
já fui alvo de um tentativa de expulsão do Conselho de Representantes dos
Brasileiros no Exterior, imagino haver alguns interesses contrariados, mas
tenho dificuldade em entender o porquê de uma tal ferrenha oposição.
Afinal,
não somos um partido político e não temos recursos para nos impor. Transmitimos
apenas a idéia de um projeto por julgá-lo mais eficiente, mais benéfico para os
emigrantes. Na nossa vida profissional, nada temos que seja ligado aos emigrantes
– não somos despachantes, não temos agência de viagens e nem um armazém com
produtos importados do Brasil. Não pregamos nenhuma religião implantada no
exterior, nada, portanto, que possa representar uma concorrência.
Quais
são as linhas mestras do nosso projeto que, bem aceito pelos emigrantes, é tão
severamente rejeitado por certas lideranças ? A primeira delas, que provocou
problemas na I Conferência Brasileiros no Mundo, foi a defesa da laicidade,
pela existência de um órgão institucional sem ligações com quaisquer religiões.
É
evidente que as opções religiosas dos emigrantes podem se agrupar em
associações ou ter seus grupos de atividades. Porém, os líderes religiosos
deveriam se abster de transformar sua influência em poder político. Por que ? Porque
existem diversas tendências religiosas entre os emigrantes, existem emigrantes
sem opções religiosas e certas situações ou profissões dos emigrantes poderiam
ser julgadas pelos padrões religiosos e não consideradas segundo nossas leis
laicas e republicanas.
O
outro aspecto é o relacionado com a prestação de serviços. Partimos do
princípio de que os Consulados brasileiros são tabelionatos e que seus serviços
devem ser facilitados ao máximo aos emigrantes. No mês passado, foram tomadas
medidas no Brasil para facilitar a transcrição nos cartórios brasileiros de
documentos lavrados nos Consulados.
Aparentemente,
uma boa medida, porém, na verdade facilitadora mas não solucionadora. Queremos
que os documentos lavrados nos tabelionatos brasileiros no exterior, os
Consulados, não precisem ser recopiados ou transcritos por iniciativa dos
emigrantes. Se os Consulados produzem documentos autênticos, por que
recopiá-los nos cartórios. Pura burocracia, mantida provavelmente pelo lobby
dos cartórios. Isso inclui as homologações de divóricios, mera formalidade que
alimenta advogados e ocupa o precioso tempo dos juízes do Supremo Tribunal
Federal.
O
outro aspecto criador de oposições é o de postularmos um órgão ligado
diretamente ao governo federal, como as Secretarias da Mulher ou da Igualdade
Racial, e sem a tutela do Itamaraty. Evidentemente, tratando-se de emigrantes
deverá haver uma relação constante com o Itamaraty, porém não em condições de
sujeição mas de igualdade. Por isso, a necessidade do órgão emigrante ser dirigido
por alguém de confiança do governo, para haver uma integração e uniformidade
entre a política externa brasileira com medidas tomadas em favor dos
emigrantes.
Por
que a experiência do Conselho de emigrantes (CRBE) não deu certo ? Porque ficou
no meio do caminho – criou-se o chamado orgão de interlocução e de assessoria
junto a uma Subsecretaria do MRE. Ou seja, a interlocução pretendida com o
governo foi prejudicada, por ser na realidade uma interlocução com uma
repartição do MRE sem poder de decisão. Em outras palavras, o CRBE virou um
mero apêndice um faz de conta sem real funcionalidade dentro do organograma do
governo.
Um
conselho representativo sempre é importante por levar as aspirações dos
emigrantes mas precisa ter como receptário um órgão decisório e não apenas
registrador das reivindicações dos emigrantes em Atas. O Conselho deve ser
ligado à Secretaria dos Emigrantes para transmitir suas reivindicações a quem
pode receber, examinar e atender ou rejeitar.
E
para terminar mais uma vez uma declaração de princípio – se o CRBE não
funcionou foi por falha fundamental de criação, por não dispor de condições
para funcionar. Não é verdade que combatemos o CRBE ou que quisemos sua
destruição. Não, desde o princípio dissemos que o CRBE deveria ser uma simples
e curta etapa para um órgão emigrante sem a tutela do Itamaraty. Queríamos a
transformação do CRBE num Conselho de Transição. Nossas críticas, nossa luta
foram sempre – e continuam sendo – construtivas.
E
é por isso que, apesar de atos tão mesquinhos como tentar a destruição de um
grupo no Facebook, de pressões e de ameaças, decidimos que vamos prosseguir,
até sermos ouvidos pelo governo, pela Casa Civil, pela presidenta Dilma, ou
pelos senadores e deputados.
PS.
estamos preparando um documento sobre o órgão institucional emigrante para ser
entregue às autoridades. Se você, emigrante, quer colocar nele sua assinatura,
deixe seu recado em comentários, logo embaixo. Publicado originalmente no site
Direto da Redação
Rui
Martins, jornalista, escritor, correspondente em Genebra.
O Caso Assange
Por
Frei Betto - de São Paulo
O
site WikiLeaks, monitorado pelo australiano Julián Assange, publicou documentos
secretos que deixaram governos e autoridades envergonhados, sem argumentos para
justificar tantos abusos e imoralidades.
Em
2010 o mundo foi surpreendido pela divulgação de uma série de documentos
comprobatórios de que muitos governos e autoridades dizem uma coisa e fazem
outra. A máscara caiu. Todos viram que o rei estava nu.
Maquiavel
já havia afirmado, no século XVI, que a política tem pelo menos duas caras. A
que se expõe aos olhos do público e a que transita nos bastidores do poder.
Bush
e Obama admitiam torturas no Iraque, no Afeganistão e na base naval de
Guantánamo, enquanto acusavam Cuba, na Comissão de Direitos Humanos da ONU, em
Genebra, de maltratar prisioneiros…
O
WikiLeaks nada inventou. Apenas se valeu se fontes fidedignas para coletar
informações confidenciais, em geral constrangedoras para governos e
autoridades, e divulgá-las. Assim, o site desempenhou importante papel
pedagógico. Hoje, as autoridades devem pensar duas vezes antes de dizer ou
fazer o que as envergonhariam, caso caísse em domínio público.
Apesar
da saia justa, o cinismo dos governos parece não ter cura. Em vez de admitirem
seus erros e tramoias de bastidores, preferem bancar a raposa da fábula de
Esopo, divulgada por La Fontaine. Já que as uvas não podem ser alcançadas,
melhor alegar que estão verdes…
Acusam
Julián Assange – não de mentir ou divulgar documentos falsos – mas de haver
praticado estupro de prostitutas, na Suécia.
Ora,
com todo respeito à mais antiga profissão do mundo, sabemos todos que
prostitutas se entregam a quem lhes paga. E por dinheiro – ou ameaça de
extradição quando são estrangeiras – algumas delas podem ser induzidas a fazer
declarações inverídicas, como a esdrúxula acusação de estupro.
Muito
estranho, considerando que relações com prostitutas muitas vezes parecem um
estupro consentido. O cliente paga pelo direito de usar e abusar de um corpo
desprovido de reciprocidade – sem afeto e libido. Daí a sensação de fraude que
o acomete quando deixa o prostíbulo. Perdeu o sêmen, o dinheiro… e não
encontrou o que procurava – amor.
De
fato, governos e autoridades denunciados pelo WikiLeaks é que estupraram a
ética, a decência, a soberania alheia, acordos e leis internacionais. Assange e
seu site foram apenas o veículo capaz de tornar mundialmente transparentes
documentos contendo informações mantidas sob rigoroso sigilo.
Punidos
deveriam ser aqueles que, à sombra do poder, conspiram contra os direitos
humanos e a legislação internacional. No mínimo, deveriam fazer autocrítica
pública, admitir que abusaram do poder e violaram princípios áureos, como foi o
caso de ministros brasileiros que se deixaram manipular pelo embaixador dos
EUA, em Brasília.
Assange
se encontra refugiado na embaixada do Equador, em Londres. O governo de Rafael
Correa já lhe concedeu o direito de asilo no país latino-americano. Porém, o
governo britânico, do alto de sua majestática prepotência, ameaça prendê-lo
caso ele saia da embaixada a caminho do aeroporto, onde embarcaria para Quito.
Nem
a ditadura brasileira na Operação Condor chegou a tanto em relação a centenas
de perseguidos refugiados em embaixadas de países do Cone Sul. Por isso, a OEA,
indignada, convocou uma reunião de seus associados para tratar do caso Assange.
Este teme ser preso ao deixar a embaixada e entregue ao governo sueco que, em
seguida, o poria em mãos dos EUA, que o acusam de espionagem – crime punido,
pelas leis estadunidenses, inclusive com a pena de morte.
Assange
não se nega a comparecer perante a Justiça sueca e responder pela acusação de
estupro. Teme apenas ser vítima de uma cilada diplomática e acabar em mãos do
governo mais desmoralizado pelo WikiLeaks – o que ocupa a Casa Branca.
O
caso Assange já prestou inestimável serviço à moralidade global: demonstrou
que, debaixo do sol, não há segredos invioláveis. Como diz o evangelho de Lucas
(12, 2 e 3) “nada há encoberto que se não venha a descobrir; nem oculto, que se
não venha a saber. Por isso o que dissestes nas trevas, à luz será ouvido; o
que falastes ao ouvido no interior da casa, será proclamado dos telhados”.
Frei
Betto é escritor, autor de “A obra do Artista – uma visão holística do
Universo” (José Olympio), entre outros livros. www.freibetto.org –
Twitter:@freibetto.
segunda-feira, 27 de agosto de 2012
Serejo: Um livro faz cem anos
Por:
Vicente Serejo
A
Acta Diurna de Câmara Cascudo, publicada na edição de 14 de outubro de 1939, em
A República, demorou quinze anos, mas foi, até o final dos anos sessenta, o
único sol a brilhar, num adeus de admiração, sobre a figura intelectual de João
Batista de Vasconcellos Chaves, Dr. João Chaves. Aquele que em 1968 daria nome
à colônia penal de Natal, demolida há alguns anos, símbolo de lugar desumano,
conhecido como ‘Caldeirão do Diabo’. Destruída para sempre, apagou-se dali a
homenagem a um dos maiores criminalistas do Brasil do seu tempo.
João
Chaves nasceu no belo solar do Ferreiro Torto, em Macaíba, a 4 de outubro de
1875, e faleceu a 28 de abril de 1924, aos 49 anos. Viveu pouco, e muito cedo
acendeu sua chama de homem genial ao publicar, em 1912, aos 37 anos, o seu
‘Sciencia Penitenciária’, ainda grafado assim, longo tratado sobre um direito
novo, publicado pela Livraria Clássica de A. M. Teixeira & Cia, com prelos
instalados na Praça dos Restauradores, Porto, Portugal.
Antes,
já publicara uma memória da Faculdade Livre de Direito do Pará, onde viveu seus
primeiros anos de advogado e professor de Direito formado em Recife. Visitou
vários países europeus consultando bibliotecas e centros jurídicos e chegou a
anunciar no primeiro tomo mais dois volumes que completariam sua obra sobre a
ciência penitenciária: o primeiro sobre o tema da prevenção; o segundo todo
dedicado ao estudo da pena no âmbito militar.
Ciência
Penitenciária é um livro planejado e escrito com rigor técnico e bibliografia
erudita, de vários países, e distribuído ao longo de quase quatrocentas
páginas. Num apuro intelectual inegável, o autor divide a matéria em três
partes: Introdução, com oito capítulos e secções; Sistema Educativo, mais oito
capítulos e secções; e Sistema de Eliminação, esta com quatro capítulos, com
introdução e três visões: pena de morte, deportação e delegação.
Meticuloso
na organização do volume para garantir a acessibilidade a todos os trechos do
corpo da matéria, Ciência Penitenciária tem numeração geral de todos os 221
parágrafos, da introdução ao último trecho. Mas, ao mesmo tempo, cheio de
pudor, logo avisa no pequeno prefácio que escreve, antes da introdução: é livro
desajudado, sem nome consagrado que lhe apresente, e a crítica livre para não
ferir o pudor de fazer elogios como se fosse favor.
Sem
deixar se tocar pela pretensão, Chaves é claro naquilo a que seu livro se
destina, às mesas acadêmicas, mas informa que pode ser uma contribuição à ordem
legislativa, quando a nova ciência for tratada por legisladores. E proclama,
sem vaidade, que é apenas ‘um ensaio de propaganda das idéias penitenciárias’.
Se fosse apenas isso, não seria um pioneirismo de valor filosófico a erguer um
novo conceito de ciência, olhar pioneiro no Direito Brasileiro.
Embora
já tendo alguma paternidade naquela primeira década do século, a Ciência
Penitenciária, para Chaves, continuava a ser um tema em discussão até para ele
que já percorrera, ao longo de 1911 e 1912, vários países da Europa na busca de
conhecer o que havia de mais ousado no novo saber ainda tão obscuro nas suas
leis e postulados. Para ser a nova ciência consagrada por todos, de Sócrates a
Platão, de Howard a Bonavita e Mabillon.
Andando
pelas velhíssimas prisões de Milão e Amsterdã; o claustro dos conventos e as
celas dos antigos monastérios, sobre todas as formas de reclusão João Chaves
lançou seu olhar. Leu sobre a crença do Círculo Noturno, velha e obscura
sociedade filantrópica que imaginava ser capaz de ensinar aos condenados as
virtudes da alma; e estudou a teoria dos mestres italianos, para quem a pena é
a força que eleva a moral dos degradados pelo crime.
A
discussão final do livro, depois de percorrer mais de 350 páginas feitas de
questões e questionamentos em todos os níveis da ciência penitenciária, é sobre
a pena de morte. João Chaves parte da visão platônica, aquela que para ele foi
a mais branda, antes do movimento contra a pena capital, no Século XVIII, então
liderada por Beccaria e Sonnenfels. Segundo Platão, repetindo as palavras de
Chaves, ‘o crime é uma moléstia e o criminoso um doente’.
Plantão
vai além: ‘todos os remédios devem ser aplicados e só quando impossível a
transformação do criminoso pela sua incurabilidade’ caberia ao Estado – no
caso, a Athenas – deportá-lo do território ou executá-lo. É Platão, ainda, quem
afirma: a pena de morte é uma forma ‘de livrar a República de um perigo’, e
‘libertar o desgraçado de uma existência pesada’. A lição não convence a Chaves
que ergue, a partir daí, seu grande questionamento.
Técnico,
numa linguagem atual, limpa dos arabescos e ornatos, lança as duas questões
fundamentais para condenar a pena de morte. E pergunta: 1) Serve a morte aos
fins da pena? 2) Servindo aos fins da pena, apresenta todos os caracteres que
ela deve preencher? Ele mesmo responde: a pena de morte serve ao desejo ‘da
eliminação completa e absoluta’, mas não repara’. E acusa: ‘Falta à pena de
morte o característico essencial da reparabilidade’.
Ousado,
encerra o capítulo negando qualquer eficiência à pena de morte, até mesmo como
força exemplar. Para ele, nem o caráter excepcional se justificaria porque é
injusta. E fustiga seu caráter excepcional – ‘Ela será tanto mais injusta e
inconveniente quanto mais excepcional’ – para concluir, sereno e sem dúvida,
como um juiz seguro diante da sentença, impondo ao culpado uma pena perpétua:
‘A pena de morte é legítima, mas não é necessária’.
Foi
por esse gênio, o Dr. João Chaves, nascido em Macaíba e desaparecido aos 49
anos, que o grande Evaristo de Morais perguntou a Câmara Cascudo, em 1935.
Aquele homem de pele branca, grave e triste, que Cascudo viu uma única vez,
conversando com seu pai, numa tarde de 1917. Vestido de preto, pince-nez
emoldurando os olhos, mãos enluvadas para esconder a doença. Aquele homem de
gestos tímidos que fez do primeiro cumprimento ao filho do amigo um gesto de
distância e adeus. Um pudor suave e calado, porque voltara à sua terra sem
felicidade. Para morrer, recluso e deformado, numa manhã velha do Tirol.
STJ firma jurisprudência em defesa das minorias
Uma
das bases fundamentais dos direitos humanos é o princípio de que todas as
pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. Discriminação e
perseguição com base em raça, etnia ou opção sexual são claras violações desse
princípio. Assim, não é de estranhar a quantidade de pedidos que a Justiça
brasileira tem recebido de indivíduos pertencentes às chamadas minorias - como
os homossexuais, negros, índios, portadores do vírus HIV ou de necessidades especiais,
entre outros -, que buscam no Judiciário a proteção institucional de seus
interesses.
Ao
longo de sua história, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) vem firmando
jurisprudência em prol dessas minorias, como, por exemplo, ao reconhecer a
possibilidade de união estável e até mesmo de casamento civil entre pessoas do
mesmo sexo, ou ao determinar o pagamento de dano moral a uma comunidade
indígena, alvo de conflitos com colonos em assentamento irregular nas terras
dos índios.
O
STJ também, em decisão inédita, já classificou discriminação e preconceito como
racismo, além de entender que é cabível a isenção de tarifa de transporte
público para portador do vírus HIV.
O
papel do STJ na efetivação dos direitos desses segmentos da sociedade tem sido
reconhecido não só no meio jurídico, mas em todos os lugares onde existam
pessos dispostas a combater a discriminação. O STJ detém o título de Tribunal
da Cidadania e, quando atua garantindo direitos de maneira contramajoritária,
cumpre um de seus mais relevantes papéis, afirma o ministro Luis Felipe
Salomão.
Relações
homoafetivas
Em
decisão inédita, a Quarta Turma do STJ reconheceu a possibilidade de
habilitação de pessoas do mesmo sexo para o casamento civil. O colegiado
entendeu que a dignidade da pessoa humana, consagrada pela Constituição, não é
aumentada nem diminuída em razão do uso da sexualidade, e que a orientação
sexual não pode servir de pretexto para excluir famílias da proteção jurídica
representada pelo casamento (REsp 1.183.378).
Segundo
o relator do recurso, ministro Luis Felipe Salomão, o raciocínio utilizado,
tanto pelo STJ quanto pelo Supremo Tribunal Federal (STF), para conceder aos
pares homoafetivos os direitos decorrentes da união estável, deve ser utilizado
para lhes franquear a via do casamento civil, mesmo porque é a própria
Constituição Federal que determina a facilitação da conversão da união estável
em casamento, afirmou.
O
mesmo colegiado, em abril de 2009, proferiu outra decisão inovadora para o
direito de família. Por unanimidade, os ministros mantiveram decisão que
permitiu a adoção de duas crianças por um casal de mulheres.
Seguindo
o voto do ministro Luis Felipe Salomão, a Turma reafirmou entendimento já
consolidado pelo STJ: nos casos de adoção, deve prevalecer sempre o melhor
interesse da criança. Esse julgamento é muito importante para dar dignidade ao
ser humano, para o casal e para as crianças, afirmou.
Entretanto,
o STJ sempre deu amparo judicial às relações homoafetivas. O primeiro caso
apreciado no STJ, em fevereiro de 1998, foi relatado pelo ministro Ruy Rosado
de Aguiar, hoje aposentado. O ministro decidiu que, em caso de separação de
casal homossexual, o parceiro teria direito de receber metade do patrimônio
obtido pelo esforço mútuo (REsp 148.897).
Também
foi reconhecido pela Sexta Turma do Tribunal o direito de o parceiro receber a
pensão por morte de companheiro falecido (REsp 395.904). O entendimento,
iniciado pelo saudoso ministro Hélio Quaglia Barbosa, é que o legislador, ao
elaborar a Constituição Federal, não excluiu os relacionamentos homoafetivos da
produção de efeitos no campo de direito previdenciário, o que é, na verdade,
mera lacuna que deve ser preenchida a partir de outras fontes do direito.
Em
outra decisão, a Terceira Turma do STJ negou recurso da Caixa Econômica Federal
que pretendia impedir um homossexual de colocar o seu companheiro de mais de
sete anos como dependente no plano de saúde (REsp 238.715). O colegiado
destacou que a relação homoafetiva gera direitos e, analogicamente à união estável,
permite a inclusão do companheiro dependente em plano de assistência médica.
Racismo
O
recurso pioneiro sobre o tema, julgado pelo STJ, tratou de indenização por
danos morais devido a agressões verbais manifestamente racistas (REsp 258.024).
A Terceira Turma confirmou decisão de primeiro e segundo graus que condenaram o
ofensor a indenizar um comerciário - que instalava um portão eletrônico para
garantir a proteção dos moradores da vila onde morava - em 25 salários mínimos.
Outro
caso que chamou a atenção foi o julgamento, pela Quinta Turma, de um habeas
corpus, ocasião em que o STJ, em decisão inédita, classificou discriminação e
preconceito como racismo (HC 15.155). O colegiado manteve a condenação de um
editor de livros por editar e vender obras com mensagens antissemitas. A
decisão foi uma interpretação inédita do artigo 20 da Lei 7.716/89, que pune
quem praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça.
Em
outro habeas corpus, o mesmo colegiado determinou que dois comissários de bordo
de uma empresa aérea, acusados de racismo, prestassem depoimento à Justiça
brasileira no processo a que respondiam (HC 63.350). A Quinta Turma negou
pedido para que eles fossem interrogados nos Estados Unidos, onde residem.
Segundo
o relator do processo, ministro Felix Fischer, a Turma manteve a ação penal por
entender que a intenção dos comissários foi humilhar o passageiro
exclusivamente pelo fato de ele ser brasileiro. A ideia do ofensor foi
ressaltar a superioridade do povo americano e a condição inferior do provo
brasileiro.
O
STJ também já firmou jurisprudência quanto à legalidade e constitucionalidade
das políticas de cotas. Em uma delas, em que o relator foi o ministro Humberto
Martins, a Segunda Turma manteve a vaga, na universidade, de uma aluna negra
que fez parte do ensino médio em escola privada devido a bolsa de estudos
integral (REsp 1.254.118).
O
colegiado considerou que a exclusão da aluna acarretaria um prejuízo de tal
monta que não seria lícito ignorar, em face da criação de uma mácula ao direito
à educação, direito esse marcado como central ao princípio da dignidade da
pessoa humana. A aluna somente teve acesso à instituição particular porque
possuía bolsa de estudos integral, o que denota uma situação especial que atrai
a participação do estado como garantidor desse direito social, assinalou o
relator.
Índios
Dezenas
de etnias já circularam pelas páginas de processos analisados pelo STJ. Uma das
principais questões enfrentadas pelo Tribunal diz respeito à competência para
processamento de ações que tenham uma pessoa indígena como autor ou vítima. A
Súmula 140 da Corte afirma que compete à Justiça estadual atuar nesses casos.
No entanto, quando a controvérsia envolve interesse indígena, há decisões no
sentido de fixar a competência na Justiça Federal. Esse entendimento segue o
disposto na Constituição Federal (artigos 109, IX, e 231).
Em
processos sobre demarcação, o STJ já decidiu que o mandado de segurança é um
tipo de ação que não se presta a debater a matéria. Quando a escolha é esse
caminho processual, o direito líquido e certo deve estar demonstrado de plano
(MS 8.873), o que não ocorre nesses casos. O Tribunal também reconheceu a
obrigatoriedade de ouvir o Ministério Público em processos de demarcação em que
se discute concessão de liminar (REsp 840.150).
A
possibilidade de pagamento de dano moral a uma comunidade indígena foi alvo de
controvérsia no STJ. Em abril de 2008, o estado do Rio Grande do Sul tentou,
sem sucesso, a admissão de um recurso em que contestava o pagamento de
indenização (Ag 1022693). O poder público teria promovido um assentamento
irregular em terras indígenas, e a Justiça gaúcha entendeu que houve prejuízo
moral em razão do período de conflito entre colonos e comunidade indígena. A
Primeira Turma considerou que reavaliar o caso implicaria reexame de provas e
fatos, o que não é possível em recurso especial.
Outra
questão julgada pelo Tribunal foi com relação à legitimidade do cacique para
reivindicar judicialmente direito coletivo da tribo (MS 13248). Segundo o STJ,
apesar de ser o líder da comunidade indígena, isso não lhe garante a
legitimidade. O relator do caso, ministro Castro Meira, observou que a intenção
do mandado de segurança impetrado pelo cacique era defender o direito coletivo,
o que é restrito, de acordo com a Constituição Federal, a partido político com
representação no Congresso Nacional e a organização sindical, entidade de
classe ou associação legalmente constituída há pelo menos um ano. No caso, o
meio adequado seria a ação popular.
Portadores
de HIV
Levando
em consideração os direitos de quem já desenvolveu a doença ou é portador do
vírus HIV, decisões do STJ têm contribuído para firmar jurisprudência sólida
sobre o tema, inclusive contribuindo para mudanças legislativas. Em abril deste
ano, a Primeira Turma do STJ manteve decisão que determinou que é cabível a
isenção de tarifa de transporte público para portador do vírus HIV e que nisso
se enquadram os serviços de transporte prestados pelo estado (AREsp 104.069).
Os
ministros da Quarta Turma, no julgamento do REsp 605.671, mantiveram decisão
que condenou o Hospital São Lucas da Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul ao pagamento de indenização a paciente infectada com o vírus da
AIDS quando fazia a transfusão devido a outra doença.
Para
o relator, ministro Aldir Passarinho Junior, hoje aposentado, nem o hospital
nem o serviço de transfusão tinham controle da origem do sangue, o que indicava
a negligência e desleixo. O ministro destacou, ainda, que houve negativa do
hospital em fornecer os prontuários e demais documentos, indicando mais uma vez
comportamento negligente.
Em
outro julgamento de grande repercussão na Corte, a Terceira Turma obrigou
ex-marido a pagar indenização por danos morais e materiais à ex-esposa por ter
escondido o fato de ele ser portador do vírus HIV.
No
caso, a ex-esposa abriu mão da pensão alimentícia no processo de separação
judicial e, em seguida, ingressou com ação de indenização alegando desconhecer
que o ex-marido era soropositivo. O relator do processo, o saudoso ministro
Humberto Gomes de Barros, destacou que o pedido de alimentos não se confunde
com pedido indenizatório e que a renúncia a alimentos em ação de separação
judicial não gera coisa julgada para ação indenizatória decorrente dos mesmos
fatos que, eventualmente, deram causa à dissolução do casamento.
Caso
a vítima de dano moral já tenha morrido, o direito à indenização pode ser
exercido pelos seus sucessores. A Primeira Turma reconheceu a legitimidade dos
pais de um doente para propor ação contra o Estado do Paraná em consequência da
divulgação, por servidores públicos, do fato de seu filho ser portador do vírus
HIV.
Segundo
o relator do processo, ministro aposentado José Delgado, se o sofrimento é algo
pessoal, o direito de ação de indenização do dano moral é de natureza
patrimonial e, como tal, transmite-se aos sucessores.
Quando
a assunto é saúde, o STJ já entendeu que não é válida cláusula contratual que
excluiu o tratamento da AIDS dos planos de saúde. A Quarta Turma já reconheceu
o direito de um beneficiário a ter todos os gastos com o tratamento da doença
pagos pela Amil (REsp 650.400).
A
Terceira Turma também se posicionou sobre o assunto, declarando nula, por
considerá-la abusiva, a cláusula de contrato de seguro-saúde que excluiu o
tratamento da AIDS. O colegiado reconheceu o direito de uma aposentada a ser
ressarcida pela seguradora das despesas que foi obrigada a adiantar em razão de
internação causada por doenças oportunistas (REsp 244.847).
Necessidades
especiais
O
STJ vem contribuindo de forma sistemática para a promoção do respeito às
diferenças e garantia dos direitos de 46 milhões de brasileiros que possuem
algum tipo de deficiência (Censo 2011). Nesse sentido, uma das decisões mais
importantes da Casa, que devido à sua abrangência se tornou a Súmula 377, é a
que reconhece a visão monocular como deficiência, permitindo a quem enxerga
apenas com um dos olhos concorrer às vagas destinadas aos deficientes nos
concursos públicos.
Algumas
decisões importantes do STJ também garantem isenção de tarifas e impostos para
os deficientes físicos. Em 2007, a Primeira Turma reconheceu a legalidade de
duas leis municipais da cidade de Mogi Guaçu (SP). Nelas, idosos, pensionistas,
aposentados e deficientes são isentos de pagar passagens de ônibus, assim como
os deficientes podem embarcar e desembarcar fora dos pontos de parada
convencionais.
O
relator do processo, ministro Francisco Falcão, destacou que, no caso, não se
vislumbra nenhum aumento da despesa pública, mas tão somente o atendimento à
virtude da solidariedade humana.
O
STJ também permitiu a uma portadora de esclerose muscular progressiva isenção
de IPI na compra de um automóvel para que terceiros pudessem conduzi-a até a
faculdade. De acordo com a Lei nº 8.989/1995, o benefício da isenção fiscal na
compra de veículos não poderia ser estendido a terceiros. Entretanto, com o
entendimento do STJ, o artigo 1º dessa lei não pode ser mais aplicado,
especialmente depois da edição da Lei nº 10.754/2003.
Um
portador de deficiência física - em virtude de acidente de trabalho - obteve
nesta Corte Superior o direito de acumular o auxílio-suplementar com os
proventos de aposentadoria por invalidez, concedida na vigência da Lei nº
8.213/1991. O INSS pretendia modificar o entendimento relativo à acumulação,
porém o ministro Gilson Dipp, relator do processo na Quinta Turma, afirmou que
a autarquia não tinha razão nesse caso.
O
ministro Dipp esclareceu que, após a publicação da referida lei, o requisito
incapacitante que proporcionaria a concessão de auxílio suplementar foi
absorvido pelo auxílio-acidente, conforme prescreve o artigo 86. Neste
contexto, sobrevindo a aposentadoria já na vigência desta lei, e antes da Lei
nº 9.528/1997, que passou a proibir a acumulação, o segurado pode acumular o
auxílio suplementar com a aposentadoria por invalidez.
Uma
decisão de 1999, já preconizava a posição do STJ em defesa da cidadania plena
dos portadores de deficiência. Quando a maior parte dos edifícios públicos e
privados nem sequer pensavam na possibilidade de adaptar suas instalações para
receber deficientes físicos, a Primeira Turma do Tribunal determinou que a
Assembleia Legislativa de São Paulo modificasse sua estrutura arquitetônica
para a que deputada estadual Célia Camargo, cadeirante, pudesse ter acesso à
tribuna parlamentar.
Não
é suficiente que a deputada discurse do local onde se encontra, quando ela tem
os mesmos direitos dos outros parlamentares. Deve-se abandonar a ideia de
desenhar e projetar obras para homens perfeitos. A nossa sociedade é plural,
afirmou o ministro José Delgado, hoje aposentado, em seu voto. Nesse julgamento
histórico, a Primeira Turma firmou o entendimento de que o deficiente deve ter
acesso a todos os edifícios e logradouros públicos.
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