sábado, 31 de dezembro de 2011

Um grito pela soberania dos povos indígenas - entrevista com Kauana

Resenha do livro de Antonio Carlos de Souza Lima e Maria Barroso-Hoffmann: “Etnodesenvolvimento e políticas públicas; Estado e povos indígenas: e além da tutela: bases para uma nova política indigenista”, publicado em 2002.

Por Stephan Schwartzman
Environmental Defense

Em menos de uma geração, os povos indígenas do Brasil - e da Amazônia brasileira em particular - passaram da iminência de extinção, situação descrita no panorama traçado por Darcy Ribeiro em 1957, à conquista do reconhecimento de seus direitos sobre 12% do território nacional, incluindo mais de 20% da Amazônia. No censo de 2000, a contagem oficial da população indígena mais que dobrou, quando 400 mil habitantes citadinos aproveitaram a oportunidade para se declararem índios - algo inimaginável há algumas décadas. Os volumes Etnodesenvolvimento e políticas públicas; Estado e povos indígenas; e Além da tutela, todos subintitulados Bases para uma nova política indigenista e organizados por Souza Lima e Barroso-Hoffmann, reúnem observações e reflexões de estudiosos, juristas e indigenistas com ampla experiência, compreensão crítica e participação direta nessa notável mudança. O grupo de autores inclui muitos dentre aqueles mais comprometidos com esses avanços e com o esforço de garantir sua consolidação, bem como com a visão, traçada na Constituição de 1988, de uma nova base para a relação entre sociedade nacional e povos indígenas - base esta que, na prática, permanece ainda mais virtual que real. Fruto de um seminário realizado em 1999, na conclusão do projeto Política Indigenista e Políticas Indígenas no Brasil: Um Mapeamento Prospectivo, financiado pela Fundação Ford e voltado para alimentar os debates em curso sobre a política indigenista, esta trilogia representa um sumário do estado-da-arte do pensamento antropológico e jurídico sobre esses temas.

 Embora o seminário mencionado tenha reunido líderes indígenas, representantes de agências doadoras e outros participantes cujas contribuições não foram publicadas, isso não é em parte alguma explicado. Fica-se assim com a falsa impressão de que os organizadores optaram por discutir as bases para uma nova política indigenista entre, exclusivamente, indigenistas profissionais, sem fornecer razões para essa escolha. Sem dúvida, a opção por publicar apenas estes trabalhos, e não as demais contribuições, pode ser perfeitamente razoável, mas deveria ter sido melhor explicada.

 Os três volumes abarcam um vasto terreno, e resultam em um importante recurso para a comunidade acadêmica, assim como para o governo, entidades de assistência e ONGs envolvidas na política indígena. Os artigos sobre direitos jurídicos e legislação são particularmente fortes. Os textos de Araújo e Leitão sobre os direitos indígenas pós-1988, de Juliana Santilli sobre a proteção do conhecimento indígena da biodiversidade (incluindo um catálogo da legislação e das políticas nacionais e internacionais correntes), de Aurélio Rios sobre a questão fundiária, e de Carlos Marés sobre a Constituição, serão por muito tempo referências obrigatórias em suas respectivas áreas. Atias, Mendes e Verdum também fazem contribuições importantes à análise e avaliação da assistência internacional aos povos indígenas. O artigo de Pacheco de Oliveira lança uma luz muito bem-vinda sobre o obscuro processo de consulta à sociedade civil na formulação de políticas do Banco Mundial. Azanha e Santilli sugerem novas e bem ponderadas abordagens para a organização do apoio e financiamento de projetos indígenas. As introduções sintéticas de Souza Lima e Barroso-Hoffmann enquadram com eficiência as questões em seus contextos intelectuais e históricos.

 Diversos temas atravessam os três volumes. Um deles é a separação radical entre a situação dos povos indígenas na Amazônia, de um lado, e fora dela, de outro - como nota Carlos Marés, a situação destes últimos é bem mais desesperadora, em termos de conflitos fundiários, abuso de direitos humanos, violência e condições de vida drasticamente empobrecidas (vol. 3:55). Outro tema é o da assistência internacional, oficial e não-oficial, aos povos indígenas. O fato de os grupos amazônicos serem relativamente menos pobres e marginalizados que aqueles do Nordeste e do sul do país reflete, como notam vários autores, a concentração da assistência internacional na Amazônia. Mesmo ali, porém, essa assistência é, sob vários aspectos, problemática: como dizem Souza Lima e Barroso-Hoffmann: "é necessária uma ação concertada entre as fontes de financiamento em seus variados perfis e as demandas indígenas reais: fornecer recursos para que as sociedades indígenas cumpram os destinos desejados pelos países doadores é a marca mais segura da (ir)racionalidade que permite a auto-reprodução do desenvolvimentismo sob novas roupagens" (vol. 1:28) Ou, em outras palavras, como será que índios e doadores compreendem uns as intenções dos outros, quando se encontram na floresta de projetos e parcerias que vêm florescendo desde o fim dos anos 80? Giannini levanta a mesma questão pela outra ponta, detalhando os debates que conduziram ao projeto xikrin de manejo da exploração do mogno: "Explicitamos o desempenho dos diferentes agentes sociais no contexto da sociedade Xicrin. Cada representante [] tem uma proposta para os índios atrelada a um jogo de interesses" (vol. 1:112) A questão do que índios, indigenistas e doadores pensam ser os interesses uns dos outros chama a atenção para um imenso campo potencial de investigação antropológica, o qual, tanto quanto sei, permanece praticamente intocado pela literatura (o ensaio de Souza Lima, "Problemas de qualificação de pessoal para novas formas de ação indigenista" [vol. 2] constitui, sob vários pontos de vista, uma notável exceção). Um conceito que precisaria ser examinado em uma tal investigação, também central para as discussões das políticas nessa área, é o de "sustentabilidade".

 Os interesses nas áreas indígenas da Amazônia por parte dos países doadores do Programa Piloto do G7 - e também, expressamente, do Banco Mundial - estão hoje, em larga medida, ligados à idéia de sustentabilidade - uma noção, como notam Souza Lima e Barroso-Hoffmann, de linhagem mais distinta e recente que "etnodesenvolvimento". A razão pela qual mais dinheiro internacional vai para a Amazônia do que para qualquer outra parte é que os países doadores e os bancos multilaterais foram, nos anos 80 e 90, levados à conclusão de que proteger as terras indígenas seria bom para a floresta. A preocupação ambientalista com as terras indígenas precede, de fato, a "aliança dos povos da floresta" que Souza Lima e Barroso-Hoffmann (vol. 1:15) várias vezes mencionam. A primeira audiência no parlamento americano sobre o impacto ambiental de projetos de desenvolvimento financiados por bancos multilaterais, em 1983, apresentou, entre outros, o antropólogo David Price falando da situação dos Nambiquara. A mesma preocupação esteve presente ao longo de todas as campanhas ambientalistas norte-americanas junto aos bancos de desenvolvimento multilaterais desde então. Os organizadores da trilogia argumentam que, em virtude da virada ambientalista das agências doadoras, "[] pouco a pouco a especificidade dos problemas dos povos indígenas, assim como as suas soluções, foi equacionada sob a condição de conservação e utilização racional e sustentável do meio ambiente com ênfase quase exclusiva na região e nas populações indígenas amazônicas, em detrimento da pluralidade de situações indígenas e ecológicas existentes no Brasil" (vol. 1:15.). Isso parece, curiosamente, supor que se os ambientalistas não tivessem assumido a luta pelos direitos territoriais indígenas na Amazônia, a pluralidade de situações teria sido melhor abordada pelas agências de desenvolvimento e pelo governo. De todo modo, enquadrar os direitos fundiários indígenas como um problema ambiental (o que indubitavelmente são) não resolveu, como notam vários autores, o dilema da negligência oficial das áreas indígenas não-amazônicas. Mas isso cria um dilema correspondente para as próprias bases de apoio ambientalistas que levaram Paulo Paiakan ao Banco Mundial e Davi Yanomami às Nações Unidas, em defesa da proteção da floresta e dos direitos indígenas. O destino das terras indígenas da Bahia ou do Mato Grosso do Sul, em termos políticos e legais, é tão relevante para o futuro das terras indígenas da Amazônia quanto aquele das terras do Pará, e isso depende, em última instância, da vitalidade e integridade dos povos e culturas que as defendem. O movimento ambientalista e as agências doadoras precisam ir além da mentalidade que conduziu a Rainforest Action Network a recusar um pedido de financiamento do Conselho Indígena de Roraima porque Raposa do Sol não fica na floresta tropical A pobreza absoluta e a marginalização social não são de modo algum bases para o desenvolvimento sustentável, e, no final das contas, as terras indígenas sobreviverão ou cairão todas juntas. Nesse sentido, o etnodesenvolvimento deveria ser visto como uma condição da sustentabilidade.

 O ponto comum de todos os ensaios reunidos nesta trilogia é a idéia de autonomia indígena. Etnodesenvolvimento, direitos coletivos, educação intercultural específica, tudo isso tem como objetivo último preservar a possibilidade de que os próprios povos indígenas escolham - na medida em que é dado a qualquer povo fazê-lo - seu futuro coletivo. Gilberto Azanha cita uma frase contundente de Iara Ferraz: "E o desafio permanente consiste em se reproduzirem como sociedades etnicamente diferenciadas e lidar, ao mesmo tempo, com condições materiais de existência cada vez mais adversas e multifacetadas" (vol. 1:31). O complemento disso é expresso na crítica de Pacheco de Oliveira da política do Banco Mundial para os povos indígenas: "Falta nos documentos alguma afirmação mais positiva [] indicando a importância das sociedades indígenas no mundo contemporâneo, qualificando a preservação de seu patrimônio cultural e a sua sociodiversidade como dever moral e intelectual da humanidade" (vol. 3:119) Ferraz está indubitavelmente correta em dizer que as condições materiais de existência dos povos indígenas se tornarão cada vez mais difíceis - a pressão sobre suas terras, bem como aquelas exercida pelos interesses que buscam obter acesso a seus recursos naturais, se tornarão maiores, não menores, para considerar apenas uma das dimensões do problema. A afirmação de Pacheco de Oliveira explica, assim, a organização dos volumes: o problema dos povos indígenas é a nossa sociedade, não as sociedades deles. Se tal compreensão tem sido explícita na antropologia brasileira desde Darcy Ribeiro, permanece o fato de que reformular a política indigenista é uma questão nacional, uma tarefa que cabe à sociedade majoritária. Mas, afinal, a política indigenista sempre foi um assunto menor no contexto das relações mais gerais entre nossas sociedades e minorias indígenas.

 O que está faltando nessa discussão é alguma análise da política antiindigenista - o PPA, os mercados de soja, o desenvolvimento hidrelétrico, para não mencionar a grilagem, o narcotráfico e a extração ilegal de madeira -, assim como das perspectivas de alterar, ou pelo menos de influenciar substantivamente, a matriz mais ampla de forças reunidas contra os projetos de autonomia dos povos indígenas. Em última instância, a não ser que possamos conceber a possibilidade de tornar nossas próprias sociedades de mercado globalizadas mais sustentáveis e eqüitativas, todos os projetos de conservação/desenvolvimento integrados existentes no universo serão de pouca valia para a autonomia e sustentabilidade das sociedades indígenas. O problema não é, como afirma Paul Little, que imaginamos os índios como "selvagens ecologicamente nobres" (vol. 1:40), mas, antes, que falhamos em nos imaginar como outra coisa além de simples bárbaros sociais e ecológicos.

 Mana
Quinta da Boa Vista s/n - São Cristóvão
20940-040 Rio de Janeiro RJ Brazil

Governo insere 52 nomes na "lista suja" do trabalho escravo

 Por Leonardo Sakamoto

Goiás contesta dados da CPT sobre trabalho escravo e diz que número de casos diminuiu no Estado Conflitos no campo diminuem, mas denúncias de trabalho escravo crescem em 2011, diz CPT Trabalho escravo no campo cresceu 23% em 2011, diz Comissão Pastoral da Terra Justiça Federal decreta prisão de fazendeiro por trabalho escravo no Pará MPF abre denúncia contra fazendeiros por prática de trabalho escravo em Campos (RJ) Polícia resgata seis trabalhadores escravos em Goiás; Estado tem 200 casos este ano Ministério do Trabalho flagra trabalho escravo em obras da construtora MRV no interior de São Paulo

Atualizada nesta sexta (30), o cadastro de empregadores flagrados com mão-de-obra análoga à de escravo cresceu com a entrada de 52 novos registros, chegando ao número recorde de 294 nomes, de acordo com notícia divulgada no Blog do Sakamoto. Entre os que entraram na “lista suja” estão grupos sucroalcooleiros, madeireiras, empresários e até uma empreiteira envolvida na construção da usina hidrelétrica de Jirau. A relação inclui também médicos, políticos, famílias poderosas e casos de exploração de trabalho infantil e de trabalho escravo urbano. Para ver a lista atualizada, clique aqui.

 A “lista suja” tem sido um dos principais instrumentos no combate a esse crime, através da pressão da opinião pública e da repressão econômica. Após a inclusão do nome do infrator, instituições federais, como o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal, o Banco da Amazônia, o Banco do Nordeste e o BNDES suspendem a contratação de financiamentos e o acesso ao crédito. Bancos privados também estão proibidos de conceder crédito rural aos relacionados na lista. Quem é nela inserido também é submetido a restrições comerciais e outros tipo de bloqueio de negócios por parte das empresas signatárias do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo – que representam mais de 25% do PIB brasileiro.

 O nome de uma pessoa física ou jurídica é incluído na relação depois de concluído o processo administrativo referente à fiscalização dos auditores do governo federal e lá permanece por, pelo menos, dois anos. Durante esse período, o empregador deve garantir que regularizou os problemas e quitou suas pendências com o governo e os trabalhadores. Caso contrário, permanece na lista.

 Abaixo, trechos da apuração de Bianca Pyl, Daniel Santini e Maurício Hashizume, da Repórter Brasil, que monitora o cadastro desde sua criação em novembro de 2003:

 Entre os novos registros, há casos como o de Lidenor de Freitas Façanha Júnior, cujos trabalhadores, segundo os auditores fiscais do trabalho envolvidos nas operações de libertação, bebiam água infestada com rãs, e o do fazendeiro Wilson Zemann, que explorava crianças e adolescentes no cultivo de fumo. Entre os estados com mais inclusões nesta atualização estão Pará (9 novos nomes), Mato Grosso e Minais Gerais (8 cada). A incidência do problema no chamado Arco do Desmatamento demonstra que a utilização de trabalho escravo na derrubada da mata para a expansão de empreendimentos agropecuários segue presente.

 Nesta atualização, apenas dois nomes foram retirados do cadastro (Dirceu Bottega e Francisco Antélius Sérvulo Vaz), o que pesou para que a relação chegasse a quase 300 registros.

Escravos da cana

Entre os destaques da atualização estão libertações que chamam a atenção pelo grande número de escravos resgatados em plantações de cana-de-açúcar. Só na Usina Santa Clotilde S/A, uma das principais de Alagoas, foram flagrados 401 trabalhadores em situação degradante em 2008. Também entra nesta atualização a Usina Paineiras, que utilizou 81 escravos em Itabapoana (RJ) em 2009. Um ano após o flagrante que resultou nesta inclusão, a empresa comprou a produção da Erbas Agropecuária, onde foram flagrados 95 trabalhadores escravizados.

 Mesmo com o aumento da preocupação social por parte das usinas, real ou apenas declarado, o setor ainda tem ocorrências de mão-de-obra escrava.

 A Miguel Forte Indústria S/A foi flagrada explorando 35 trabalhadores, incluindo três adolescentes, na colheita de erva-mate em Bituruna (PR). A madeireira, que mantinha o grupo em barracões de lona sob comando de “capatazes”, anuncia na sua página que “o apoio a projetos sociais que promovem a cidadania e o bem-estar, principalmente entre a população carente, mostra o comprometimento da Miguel Forte com os ideais de uma sociedade mais justa e humana”. À frente da empresa, Rui Gerson Brandt, acumula o cargo de presidente do Sindicato das Indústrias de Papel e Celulose do Paraná (Sindpacel).

Hidrelétrica de Jirau

Não é só na monocultura ou no campo que os flagrantes acontecem. As condições degradantes em projetos bilionários do país têm sido uma constante e, nesta atualização, uma das empreiteiras envolvidas na construção de uma hidrelétrica também entrou na lista. A Construtora BS, contratada pelo consórcio Energia Sustentável do Brasil (Enersus), foi flagrada utilizando 38 escravos na construção da Usina Hidrelétrica de Jirau. Além de enfrentarem problemas relacionados aos alojamentos, segurança no trabalho e saúde, os empregados ainda eram submetidos a escravidão por dívida, por vezes em esquemas sofisticados que envolvem até a cobrança por meio de boletos bancários, conforme denunciado, na época, pela Repórter Brasil.

 Mesmo após o flagrante, as condições de trabalho não melhoraram, segundo denúncias recentes. Em abril deste ano, um grupo de 20 trabalhadores procurou o Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil de Rondônia (Sticcero) alegando que a BS não havia pago o aviso prévio e eles estavam dormindo no galpão da Construtora, sem ter como voltar para casa. Uma liminar chegou a bloquear os bens da empresa em 2011.

 O isolamento, aliás, continua sendo utilizado como ferramenta para escravizar pessoas. Nesta atualização da lista, foi incluído Ernoel Rodrigues Junior, cujos trabalhadores estavam em um local de tão difícil acesso que foi necessário um helicóptero para o resgate dos trabalhadores. ??Entre os libertados estavam dois adolescentes de 15 e 17 anos e uma de 16 anos. Para chegar no local em que o grupo estava, foi necessário percorrer a partir de São Félix do Xingu (PA) por 14 horas um caminho que contava com uma ponte de madeira submersa, balsa e estradas de terra em condições tão ruins que foi necessário o uso de tratores para desatolar alguns dos veículos. De acordo com os relatos colhidos pela fiscalização, todos tinham medo de reclamar porque o fazendeiro e o segurança da propriedade andavam armados. Para que conseguisse fazer a denúncia, um trabalhador explorado conseguiu fugir e teve de caminhar durante seis dias pela mata e por estradas de terra.

 Outro destaque na atualização da “lista suja” neste ano é a inclusão de Fernando Jorge Peralta pela exploração de escravos na Fazenda Peralta, em Rondolândia (MT). O Grupo Peralta é um conglomerado empresarial poderoso, do qual fazem parte a rede de supermercados Paulistão, a Brasterra Empreendimentos Imobiliários, as concessionárias Estoril Renault/Nissan (em Santos, Guarujá e Praia Grande), os shoppings Litoral Plaza Shopping e Mauá Plaza Shopping (cuja construção, na época, envolveu uma denúncia de propina), a Transportadora Peralta (Transper) e a PRO-PER Publicidade e Propaganda, só para citar os principais ramos de atividade do grupo. O flagrante que levou Fernando Jorge à “lista suja” aconteceu em 2010 e envolveu a libertação de 11 trabalhadores de sua fazenda.

 Luiz Carlos Brioschi e Osmar Brioschi, que também entram na lista nesta atualização, foram flagrados se aproveitando de 39 trabalhadores na colheita do café em Marechal Floriano (ES). Eles mantinham os empregados em regime de escravidão por dívidas e em condições extremamente precárias de trabalho e vida. Dois dias após a libertação ter sido divulgada, Osmar Brioschi esteve entre os homenageados com placas e diplomas na Assembleia Legislativa do Espírito Santo pelo “trabalho realizado em favor do campo capixaba”, por iniciativa do deputado Atayde Armani (DEM-ES).

Devastação ambiental

Outro aspecto reforçado pela atualização da lista é o elo entre escravidão e devastação ambiental. O uso de escravos em grandes projetos de desmatamento e em áreas com conflitos agrícolas é bastante comum. Desta vez, foi incluído na relação Tarcio Juliano de Souza, apontado como responsável pela destruição de milhares de hectares de floresta amazônica nos últimos anos. Ele é considerado pela Polícia Federal responsável por montar um esquema para desmatar cerca de 5 mil hectares de floresta nativa na região de Lábrea (AM), onde mantém a Fazenda Alto da Serra. Chegou a ser preso em Rio Branco (AC) pelos crimes de redução de pessoas a condições análogas à escravidão, aliciamento de trabalhadores e destruição de Áreas de Preservação Permanente (APPs) e foi denunciado por tentar comprar um fiscal. Na época, o superintendente regional do trabalho Dermilson Chagas declarou que Tárcio estava à frente de um “consórcio de fazendeiros” do Acre formado para transformar grandes áreas de Lábrea (AM) em pastos, com a utilização criminosa de escravos para o desmate, para criar gado bovino.

Políticos e doutores

Um ex-prefeito, um ex-secretário municipal do Meio Ambiente e dois médicos estão entre os que entraram na relação nesta atualização. O ex-prefeito Edmar Koller Heller foi flagrado em 2010 explorando mão-de-obra escrava em um garimpo na Fazenda Beira Rio, que fica em Novo Mundo (MT), a 800 km da capital mato-grossense Cuiabá (MT), próximo à divisa com o Pará. Edmar foi prefeito de Peixoto de Azevedo (MT) em 2000, pelo extinto PFL (hoje DEM). Teve seu mandato cassado após ser acusado de desvio de recursos públicos, contratação de pessoal especializado sem licitação e contratação ilegal de veículos automotores de auxiliares de confiança.

 Em 2007, ele se envolveu em outro escândalo político e chegou a ser preso. Como secretário de Administração da prefeita Cleuseli Missassi Heller, sua esposa, ele foi considerado responsável por improbidade administrativa, configurada pelo favorecimento de uma única empresa em processos licitatórios do município. Em 2009, a Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso manteve a condenação.

 Outro político que passa a fazer parte da lista é Evanildo Nascimento Souza, flagrado com escravos quando ainda era secretário de Meio Ambiente de Goianésia do Pará (PA). O homem que deveria zelar pela natureza foi flagrado explorando trabalhadores justamente no corte e queima de madeira para produção de carvão. De acordo com o Ministério Público do Trabalho (MPT), foram encontrados na Fazenda RDM (onde se localiza a Carvoaria da Mata), em julho de 2009, nove trabalhadores laborando em condições degradantes no corte de madeira, transporte, empilhamento, enchimento dos fornos, vedação do forno com barro e carbonização. Os trabalhadores não possuíam equipamentos de proteção individual (EPIs) e estavam alojados em um barraco em péssimas condições, sujo com detritos, restos de maquinário e peças de veículos, armazenamento de combustível, sem separação para homens e mulheres, nem ventilação e iluminação.

 Os médicos incluídos na relação são José Palmiro Da Silva Filho, CRM 830, flagrado com cinco escravos na Fazenda São Clemente, em Cáceres (MT), e Ovídio Octávio Pamplona Lobato, CRM 3236, flagrado com 30 escravos na Fazenda Tartarugas, em Soure (PA).

Trabalho escravo no campo cresceu 23% em 2011, diz Comissão Pastoral da Terra

  Do UOL Notícias, em São Paulo

 Levantamento parcial divulgado nesta segunda-feira (12) pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) mostra que as ocorrências de trabalho escravo no campo tiveram aumento significativo no período de janeiro a setembro de 2011, na comparação com igual período do ano passado.

 Neste ano, foram registradas 218 denúncias à CPT e ao Ministério do Trabalho, contra 177 em 2010, o que representa um aumento de 23%. Para Antonio Canuto, secretário da coordenação nacional da CPT, os flagrantes cresceram devido ao aumento da fiscalização e à maior participação da sociedade, mas o número de trabalhadores vivendo em condições análogas à escravidão também cresceu.

 “O sistema vai lançando mão de formas de trabalho arcaicas para obter cada vez mais lucro”, disse. Segundo ele, tais condições são encontradas com mais frequência no corte da cana-de-açúcar, na colheita de frutas como o tomate e na extração de madeira.

 O número de pessoas resgatadas do trabalho escravo também passou de 3.854 em 2010 para 3.882 em 2011. De acordo com a CPT, a região Centro-Oeste concentrou quase 50% dos trabalhadores resgatados (1.914 do total), sendo 1.322 apenas em Mato Grosso do Sul. O maior crescimento, no entanto, foi verificado no Nordeste: a região, que registrou 19 ocorrências de trabalho escravo nos nove primeiros meses de 2010, foi responsável por 35 ocorrências no mesmo período de 2011 (aumento de 84%).

 Crimes têm maior repercussão

 De janeiro a setembro de 2011, 17 trabalhadores do campo foram assassinados no país, 32% a menos que o registrado em 2010 (25 mortes). Segundo a CPT, apesar da queda, os crimes ocorridos neste ano tiveram uma repercussão maior. “Os assassinatos tiveram uma ‘seleção’ de pessoas defensoras do meio ambiente”, disse Canuto.

 O primeiro crime que teve grande repercussão foi o assassinato do casal extrativista Maria do Espírito Santo e José Claudio Ribeiro da Silva, no Pará, no dia 24 de maio. Três dias depois, o líder camponês Adelino Ramos, um dos sobreviventes do massacre de Corumbiara, foi morto em Rondônia. Em novembro, o cacique Nísio Gomes desapareceu da aldeia em que vivia na fronteira do Mato Grosso do Sul com o Paraguai.

 De acordo com o levantamento da CPT, ao menos oito das 17 mortes estão diretamente relacionadas com a defesa do meio ambiente, e outras quatro se relacionam com comunidades (duas mortes de quilombolas e duas de indígenas).

 Ameaças de morte

 Segundo a análise da CPT, o número de pessoas ameaçadas de morte cresceu significativamente. Em 2010, houve registro de 83 pessoas ameaçadas, e em 2011 esse número saltou para 172 (aumento de 107%). Para a entidade, esse crescimento é reflexo das ações que se desenvolveram após os assassinatos de maio, quando foi entregue à Secretaria de Direitos Humanos a lista dos ameaçados de morte na última década, destacando que as ameaças haviam se concretizado em 42 casos.

 Disputa por terra e água

 Na contramão dos conflitos trabalhistas (trabalho escravo), que cresceram, as ocorrências de disputa por terra caíram de 535, em 2010, para 439, em 2011. Também houve redução nos conflitos por água (de 65 para 29).

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Comédia brutal: preto ou negro

"Negro ou preto, eis a questão"

O nosso entrevistado do mês, Nei Lopes, é autor de artigos, ensaios, contos e poemas no Brasil e outros países; publicou também diversos livros: Bantos, Malês e identidade negra; O negro no Rio de Janeiro e sua tradição musical; Sambeabá e Novo Dicionário Banto do Brasil. Mais recentemente, publicou uma obra monumental, intitulada Enciclopédia Brasileira da Diáspora Africana (S.Paulo: Selo Negro, 2004, 720 p.), objeto desta entrevista.

Nei Lopes nasceu em 1942, no subúrbio carioca. Formado em Direito nos anos de 1960, na década seguinte abandonou a advocacia para entrar no mundo artístico como compositor profissional de música popular brasileira. Aí, tornou-se consagrado, gravado por todos os grandes intérpretes do segmento samba e por ícones da MPB, como Chico Buarque, Djavan, Ed Motta, Gilberto Gil, Milton Nascimento e Zélia Duncan, entre outros. Sempre fiel em seu viés de brasileiro afro-descendente, a partir dos anos de 1980 destacou-se na militância pelos direitos dos negros.

A Enciclopédia Brasileira da Diáspora Africana é uma obra de referência para alunos, pesquisadores, professores e militantes dos direitos civis da população negra, e traz uma enorme contribuição para todos aqueles que se interessam pela cultura africana e afrodescendente, e reconhecem sua importância para a sociedade brasileira. A Enciclopédia é o resultado de longos anos de pesquisa independente de vínculos acadêmicos, fruto da sua paixão e engajamento com a problemática negra, além de sua experiência de vida. Seguindo um rigoroso critério de pesquisa, o livro contém cerca de nove mil verbetes, abordando os mais diversos assuntos, que vão de biografias a vestuário, de fatos históricos e contemporâneos a acidentes geográficos, referências à flora, fauna, festas, divertimentos, profissões e atividades ligadas à matriz cultural do mundo africano.

>> CVA - Na introdução da sua obra o senhor comenta sobre um equívoco que gera desencontros e divergências: as distinções feitas ora pela etnia ora pela cor na classificação dos brasileiros. Quer dizer, os movimentos negros usam as categorias “branco” e “negro”, enquanto o IBGE usa as categorias “branco”, “preto”, “pardo” e “amarelo”. Gostaria que o senhor nos esclarecesse a origem deste equívoco. Como acontece lá fora? E qual o melhor critério a ser adotado aqui no Brasil? Como caracterizar o afrodescendente?

Nei Lopes - Acho que vale a pena um intróito para esta conversa, que é o seguinte: à época da escravidão, a classificação dos africanos e descendentes no Brasil já não era fácil. Categorizava-se por local de nascimento (africanos ou crioulos); grau de instrução (boçais ou ladinos); condição jurídica (escravos, libertos e livres); e por cor também (pretos, mulatos, cabras, etc). Com a abolição e a subseqüente promoção da imigração européia, restou a aparência externa como única distinção válida, e aí o grande e prejudicial equívoco. Eu entendo que a categorização das pessoas, no Brasil, a partir da cor da pele e da tessitura dos cabelos é prejudicial porque contribui para desafricanizar a população brasileira. E porque essa desafricanização baseia-se em estereótipos, como aquele de que todo africano é inferior, e os perpetua. Quando se esconde a ascendência africana de um grande personagem do passado, a pretexto de “limpar” sua biografia e preservá-lo da pecha de inferior, sonega-se um tipo de informação que pode ser muito útil à emocionalidade e à construção da auto-estima do afro-brasileiro de hoje. Da mesma forma como se nega as origens núbias (negras) do Egito faraônico ou não se acredita nelas; e que se prefere estudar a África a partir do advento do tráfico atlântico e não de sua rica Antigüidade e de sua pujante Idade Média. Agora, entrando efetivamente no cerne da pergunta, sei que definir com precisão quem é descendente de africano no Brasil é extremamente difícil, por várias razões. Uma delas é que, por conta da presença maciça de africanos negros em Portugal desde o século XV, descendentes de portugueses, por exemplo, são também afrodescendentes, embora remotos. O termo “afrodescendente”, entretanto, aqui só se aplica tecnicamente, como sabemos, àquelas pessoas comprovada ou supostamente descendentes daqueles africanos que chegaram ao Brasil, escravizados ou não, no contexto do tráfico atlântico ou índico de escravos. E essa comprovação é tão difícil quanto a suposição. Supõe-se pela fenotipia (pele pigmentada, nariz largo, lábios grossos, cabelo crespo), mas quem sabe se uma pessoa assim caracterizada não descende de um drávida indiano, de um árabe meridional ou até mesmo de um melanésio, aqui chegado no “bolo” do tráfico da contracosta? Restam os relatos familiares, do tipo clássico do “minha bisavó foi pega a laço”, “meu tetravô lutou na Revolta dos Malês”... Mas quantos de nós – pelo menos na minha idade, 63 anos – temos acesso à nossa genealogia, além de umas três gerações? Trata-se de um impasse. Mas é preciso resolvê-lo. Foi por isso que, na nossa Enciclopédia Brasileira da Diáspora Africana que tem por objetivo tornar visível a importante participação da matriz africana na formação da sociedade brasileira e na civilização universal, usamos um artifício. E assim, procuramos definir um “negro” como todo descendente de negros-africanos, em qualquer grau de mestiçagem, desde que essa origem possa ser identificada historicamente e, no caso de pessoas vivas, ela seja reconhecida ou autodeclarada pela pessoa, objeto da classificação. Não sabemos se é boa a definição; mas ela aponta um caminho, que se aproxima do critério adotado nos Estados Unidos. A partir dela, acho que, no Brasil, enquanto não acharmos uma melhor, a categorização dos nossos afro-descendentes como “afro-brasileiros”, entre os quais me incluo, é boa.

>> CVA - Pode parecer óbvia esta minha questão, mas eu gostaria que o senhor desvelasse objetivamente para os nossos internautas o interesse da nossa sociedade em representar o Brasil com maioria branca; e também que nos respondesse e explicasse se a “teoria do branqueamento” no Brasil ainda está em vigor.

Nei Lopes - Agora já dá para ser mais conciso. Os núcleos familiares que, no Brasil, se revezam no poder há quase 500 anos, sempre buscaram seus referenciais (bons e maus exemplos) lá fora, nos países de população caucásica, mediterrânea ou mesmo nórdica: primeiro na Inglaterra, depois na França, mais tarde nos Estados Unidos e, hoje, na mistura cultural pop de viés anglo-saxão que sufoca o mundo inteiro. Dentro dessas referências, o padrão de comportamento diante do negro sempre foi senhorial, do tipo europeu ou norte-americano: de inglês e francês na África ocidental; de belga no Congo; de português em Angola; de dixie no sul dos Estado Unidos. Observe-se que até mesmo o misticismo oriental em moda nos anos 70 veio através da Inglaterra. Aí, as “elites” só se orgulham de ser “morenas e bronzeadas”, com “ginga e samba no pé”, quando interessa ao Departamento de Estado (caso do sucesso de Carmem Miranda, após a 2ª Guerra) ou em hora de Copa do Mundo, o que a psicanálise talvez explique melhor. Então, acho que a resposta a essa pergunta pode estar na observação de um conhecido país, aqui, vizinho ao nosso. Lá, segundo até mesmo alguns de seus historiadores, a estratégia do branqueamento, através da eliminação programada de índios e negros, foi concluída com sucesso. Aqui, apesar das antigas iniciativas oficiais e do comportamento ainda ao mesmo tempo colonizado (em relação ao exterior) e colonizador (dentro de casa) das elites, a estratégia de branqueamento, pelo menos em termos biológicos, se frustrou. Basta comparar as últimas estatísticas do IBGE.

>> CVA - Sobre a questão da auto-estima dos afrodescendentes, consciência e confiança identitária, afora em movimentos negros, como é que elas andam no Brasil e em que diferem em relação aos negros americanos?

Nei Lopes - Alguma coisa melhorou dos anos 70 para cá, algumas conquistas ocorreram, temos senadores e um ministro no STF... Mas aí vem a indústria cultural e começa a dizer que o bom lugar do negro é a “dança de rua”, a “cultura do gueto”, a “periferia”. E tome de filmes com jovens negros de arma na mão, um atrás do outro, porque esse voyeurismo da tragédia dá dinheiro. Negro nos espaços de excelência (em museus, exposições, lançamentos de livros, óperas, balés, concertos, restaurantes, etc.) na “Alta Cultura”, enfim, o cinema e a tevê não mostram. E aí, não há auto-estima que resista. Na época imperial, e até mesmo durante o escravismo, havia mais possibilidades de ascensão econômica e até social do que agora. Os Rebouças, Teodoro Sampaio, Juliano Moreira, Soares de Meireles, os bispos Dom Silvério Gomes Pimenta e Helvécio Gomes de Oliveira etc, nenhum deles precisou ser atleta ou entertainer para se tornar célebre e respeitado. Hoje, você vai assistir a um desfile militar e vê milhares de músicos negros integrando as bandas das corporações. Mas não vê esses músicos nos espaços de excelência da música, como se viu até os anos 60. Isso é só um exemplo, mas, é um tipo de exclusão e precisamos refletir sobre ele.

>> CVA - É interessante a crítica que o senhor faz em relação aos estudiosos das culturas africanas e afrodescendentes que tratam da contribuição da cultura africana para o povo brasileiro. O senhor diz que a maior parte destes pesquisadores é branca, oriunda de famílias com situação social e econômica privilegiadas, que toma as culturas africana e afrodescendente por um interesse etnográfico, uma categoria social, um número estatístico, escrevem grossas dissertações e teses, as quais não rendem nada para a consciência popular. Trata-se, sem dúvida, de uma complexa problemática. O senhor coloca como contraponto para este pesquisador, o intelectual negro militante. Aparentemente são práticas ou funções diferentes, quando não deveria sê-lo... O senhor poderia nos expor melhor o seu ponto de vista e apontar alguma saída desejável?

Nei Lopes - Assim como hoje quase não se vêem mais negros nos palcos prestigiosos da música instrumental brasileira ( música formatada por afro-descendentes como Henrique de Mesquita, Callado, Viriato, Anacleto de Medeiros, Pixinguinha ...); nem como mestres de capoeira; como sacerdotes das religiões de matriz africana – por conta de uma exclusão de fundo puramente econômico – os “especialistas” em cultura afro-originada, com espaço nos meios de comunicação, também raramente são negros. Então, eu acho apenas que os afro-brasileiros devem ser os agentes e atores principais do seu discurso e da cultura que herdaram de seus antepassados. Só isso.

>> CVA - O caderno “Prosa & Verso” do jornal O Globo, de 18/06/2005, trouxe uma entrevista com o antropólogo inglês Peter Fry, que trata da divulgação e exposição de algumas de suas idéias que estão na sua última obra “A persistência da raça – Ensaios antropológicos sobre o Brasil e a África austral” recém publicada pela Civ. Brasileira. Entre outras idéias, este antropólogo se coloca contra a polêmica política de ação afirmativa do governo em relação às cotas de afrodescendentes nas universidades públicas. Ele argumenta que, apesar destas políticas públicas serem teoricamente implementadas para reduzir as desigualdades sociais, elas só fazem reafirmar a crença em raças, na medida em que se exige uma identidade racial dos candidatos. O senhor concorda com este argumento? O senhor é contra ou a favor das cotas?

Nei Lopes - Eu penso que os bons colégios e universidades, mesmo as públicas, são também espaços privilegiados onde se perpetuam as relações de cumplicidade que mantém o “tecido social brasileiro” cada vez mais impermeável e inflexível. Aí, forma-se o círculo: o filho do banqueiro de ontem, hoje ministro da área econômica, foi colega de escola do filho do industrial que hoje é presidente da federação do seu setor, o qual foi colega do cineasta que estudou com o alto funcionário da Cultura, que é da turma do produtor cinematográfico, que é primo do executivo da gravadora, que é filho daquele banqueiro lá de cima. E por aí vai. Como diz o samba do Billy Blanco “quem está fora não entra, quem está dentro não sai”. Então eu, filho de operário, que não sou antropólogo nem sociológo e muito menos inglês; que sou apenas um afro-brasileiro que emergiu de uma condição social adversa e conseguiu, isoladamente, romper a barreira da baixa escolaridade; eu, então, sou a favor de qualquer política de ação afirmativa que repare a exclusão da massa afro-brasileira, como um todo, dentro desse contexto imobilizante.

 >> CVA - Ainda referindo-me à obra de Peter Fry, este antropólogo diz que, numa atitude extrema, as vítimas podem tornar-se algozes, o que o senhor acha disso?

Nei Lopes - Toda vítima um dia pode se tornar algoz, é lógico. E o que se costuma chamar de “racismo ao contrário”, Abdias Nascimento chama de “estratégia de imobilização”, ou seja, quando o negro reage à discriminação, ele é chamado de racista, para assim ter imobilizado e anulado o seu discurso. Aí eu me lembro de alguns relatos de exploradores coloniais portugueses como Capello & Ivens, Serpa Pinto, etc. No inferno das selvas africanas, quando seus batedores ou carregadores, submetidos à piores condições, fugiam ou lhes roubavam, eles lamentavam a “ingratidão, a “maldade”, vistas como características inatas dos pretos.

>> CVA - O senhor poderia nos falar um pouco genericamente se temos racismo no Brasil? Que tipo de racismo é esse? ou talvez tenhamos discriminação social? Ou as duas coisas? Como o racismo se impõe no Brasil e como ele é percebido pelas populações afrodescendentes?

Nei Lopes - Veja as chanchadas da Atlântida, na década de 50, e analise os papéis recorrentemente desempenhados por Grande Otelo, ator de muitas possibilidades, mas que só fazia papel de “crioulo”. Acompanhe as seções “Há 50 anos atrás” de O Globo, por exemplo, e você vai ver o que era racismo explícito. Informe-se sobre a publicação, em 1970, no boletim do Hospital dos Servidores do Estado, instituição do governo federal no Rio, de uma monografia sobre cirurgia para correção estética do “nariz negróide”. Isso é que era racismo! O de hoje é aquele insidioso – que, em nome do mercado, não escala atores negros nas telenovelas do horário nobre nem em comerciais de produtos Classe A; que não programa samba nas rádios da linha “MPB”, mas toca bossa-nova que é uma forma de samba gerada no seio da burguesia; que proibe shows de samba nas programações musicais dos shoppings, porque atrairia um público indesejado; que só valoriza o escritor afro-brasileiro quando ele escreve sobre favela e crime; que diz que Paulinho da Viola é o “príncipe do samba” mas paga a ele um cachê menor que o dos artistas alinhados com o pop, mesmo esses artistas sendo afro-descendentes também. O programa de cidadania que, ao invés de preparar para o mercado de trabalho só ensina a bater tambor, dançar “afro” e jogar capoeira, no meu entender também é racialmente discriminatório. Esse é o racismo de hoje no Brasil. Racismo de mercado. Cujas sutilezas a maior parte dos afro-brasileiros quase não percebe.

>> CVA - A Enciclopédia Brasileira da Diáspora Africana é uma obra monumental que visa à popularização dos conhecimentos afro-brasileiros, ampliando grandemente a nossa informação estereotipada, esta obra pretende também contribuir para a auto-estima do negro. Conte-nos: quanto tempo foi preciso para realizar uma obra com tamanho fôlego? Como surgiu a idéia? O senhor teve apoio, colaboradores, como foi isso?

Nei Lopes - Levei uns 10 anos organizando-a como livro, uns cinco formatando como Enciclopédia... mas, o conteúdo é acumulação de uma vida inteira. E como se trata de uma obra absolutamente pessoal, a não ser uma e outra contribuições trazidas por alguns amigos e amigas, fiz tudo, contando apenas com a força dos meus Orixás. Sem bolsa, sem patrocínio, com a cara e a coragem. Como disse o Geraldo Vandré naquele festival, “quem sabe faz a hora, não espera acontecer”. Mas, para terminar, eu gostaria de voltar um pouquinho à questão da adjetivação a ser usada para os brasileiros de origem africana. O parâmetro ideal para essa reflexão talvez seja Cuba, país com quem temos, nesse particular, afinidades históricas e sociais absolutas. Lá, está provado que a população afrodescendente alcançou, da década de 1960 até o bloqueio econômico americano, níveis de desenvolvimento humano que a puseram no caminho da inclusão completa. O que resta de racismo lá é herança da época anterior a Castro. E as estatísticas sobre a população negra, que antes eram informadas com números da ordem de 25%, hoje chegam assim: eurafricanos: 51%; europeus ibéricos 37%; afro-americanos 11% ; chineses 1%. (dados de 1996). Onde se lê “eurafricanos” e “afro-americanos”, leia-se, respectivamente, mulatos e negros (62%). Não é bem mais elucidativo?

>> CVA - Parabéns pela obra e obrigada pelos esclarecimentos. Em nome da CVA, agradeço a entrevista e desejo sucesso e coragem para o senhor dar continuidade a esta que, na falta de uma palavra melhor, parece uma missão política e social. Um abraço cordial, Gláucia.






quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Candomblé em Portugal

Aprendizagem….

Por: candombleemPortugal.wordpress.com

 A vida de Asè está repleta de desafios. As dificuldades, os sacrifícios, e as crises são frequentes em quem escolhe este caminho. Mas, se levada a sério, com entrega de alma e coração, estes momentos mais angustiantes são largamente suplantados pelas sensações de alegria, paz interior e de felicidade quase absoluta. Um dos pontos altos para qualquer filho de Santo, e provavelmente o mais esperado por todos, é o momento em que, através do seu Babalorisá ou Yalorisá, o Orisá lhe concede a bênção de lhe dirigir a palavra.

Não existe momento de maior satisfação! Desde a fase de desconfiança inicial aquando a entrada no Ilé, em que tudo é novidade e confuso, em que é analisado friamente cada movimento, variação de voz e expressão do Humano incorporado, até ao momento da acepção total do que está à sua frente é a mais pura das realidades, o filho de santo passa por uma miríade de sentimentos cruzados, ora de fé e crença absoluta, ora de profundo cepticismo e desconfiança. Mas Orisá é Orisá, e prova, sem deixar quaisquer margens para dúvidas, de que de facto é Ele que está ali à frente do jovem Yaô ou Abian, e que, os seus ensinamentos são momentos de pura luz! Se assim não for, algo está errado…

O momento em que o Orisá escolhe para falar com cada filho de Santo transforma-se para este num misto de plena alegria e satisfação, mas ao mesmo tempo de algum receio. Ninguém é perfeito, uma vez que todos somos humanos, e assim sendo, falhamos. E inconscientemente, o medo de sermos repreendidos pelos nossos erros está sempre lá. E na realidade, de forma mais ou menos directa, essa repreensão sempre acontece! Cabe a cada um, “enfiar a carapuça do que é seu, compreender o que está errado e, se por ventura não cometeu determinada falha apontada pelo Orisá, tentar evita-la a todo o custo. Os elogios… bem os elogios enchem a alma ao ponto de parecer que o nosso corpo é um invólucro demasiado frágil para conter tanta energia e satisfação! Sempre que somos tocados de forma carinhosa, ou que as palavras nos tocam no nosso âmago, sentimos que tudo vale a pena… mesmo se ultrapassado com custo. É importante no entanto, deixar um pouco de lado a estupefacção criada por uma Força pura da Natureza se materializar à nossa frente, e apreender o discurso do Orisá. Porque tudo, mas absolutamente tudo o que é dito por Ele, servirá para fazer evoluir espiritual e humanamente falando, todos os que O escutam.

É esta uma das mais importantes formas de espalhar o Asè e a boa energia. Caberá, no entanto, sempre ao filho de Santo optar entre por em prática os ensinamentos recolhidos, ou pura e simplesmente ignorá-los… predispondo-se assim a colher o fruto da sementeira da sua escolha. Que o Orisá nos conceda sempre a graça de descer e falar connosco! Sempre, nem que seja para nos “puxar as orelhas”! Se assim não acontecer, somos casos perdidos, sem retorno e deixámos de ser merecedores de ouvir a Sua voz. Que Olorum nunca permita que isso aconteça….

Yá Olga de Alaketu: vertical, humana e ecumênica.

 Por: candombleemPortugal.wordpress.com

 No final do século XVIII, durante a expansão do Daomé sobre o Reino de Ketu, no reinado de Akibiohu, duas netas do rei foram sequestradas e vendidas como escravas na Bahia. Uma delas era Otampê Ojarô que, depois de nove anos a trabalhar como empregada doméstica, já livre, teria fundado o terreiro Alaketu em Salvador.

Mãe Olga de Alaketu ou Olga Francisca Régis pertencia à quinta geração da família real africana, Olga herdou o terreiro ainda aos 12 anos de idade, e ajudou a eleva-lo à condição de património histórico da Bahia.

Filha de Yansan e Iroko, Mãe Olga de Alaketu, foi iniciada no Candomblé aos 12 anos de idade no Ilé Asè Maroiáláji ,de acordo com os costumes africanos. Muito antes da sua iniciação, trabalhava com bordados, pintura e tecelagem.

Chegada aos 79 anos, a grande Yalorisa passa os seus conhecimentos a filhos, netos e bisnetos.

Mãe Olga de Alaketu, sempre disse que em paralelo ao Candomblé, teve uma criação Católica e que sempre frequentou a igreja. Disse ter sido baptizada, crismada, seguindo assim os passos de uma tia que tinha sido criada num convento. Mãe Olga teve doze filhos biológicos, que sempre acompanharam a mãe nas tarefas do Candomblé e cresceram seguindo a religião. Ainda crianças, foram iniciados e todos os que estão vivos, ocupando cargos no terreiro.

Explicava que a relação com eles, dentro do Asè, é de acordo com as regras africanas. Em casa tinham obrigações com os estudos e com o trabalho. No Candomblé, esta grande Mãe de Santo, dizia que não existia diferença na maneira de amar e tratar os filhos biológicos e os filhos de santo. Dizia, que uma “Yàlórísá ou Bábálórísá deve ter tanto amor pelos filhos de Santo como por aqueles gerados biologicamente”! Comentava ainda muitas vezes, que pedia sempre a Deus por todos eles, para que tivessem saúde, paz e prosperidade em qualquer lugar.

Mãe Olga comentava que tinha sido rigorosa com a educação dos seus filhos, pois dizia que: “O dever de um filho é obediência e respeito ao pai”; temia ainda por certos valores que se estariam a perderem actualmente.

Outra vez comentou: “A violência é cada vez maior. Não se deve privar a diversão, mas é preciso saber para onde eles vão…” e como desejo continuava: “Peço que tenham fé em Deus e nos Orísàs (Orixas).

O Seu Ilê localizado no alto de uma colina, no bairro de Brotas, em Salvador, o terreiro Ilê Maroiá Láji é mais conhecido como Alaketu, nome referente à sua origem Nigeriana. Foi tombado em Dezembro de 2004. Na solenidade de tombamento, Mãe Olga, aos 79 anos, revelou o nome de sua sucessora – sua filha mais velha, já que a Casa segue a sucessão matriarcal. ”Mãe Olga acreditava que o Alaketu durará para sempre.” Ela sempre resistiu à ideia do tombamento do seu terreiro, temendo uma descaracterização que pudesse advir da excessiva frequência de turistas, a partir da movimentação que ela percebia nos outros terreiros, que já haviam sido tombados em Salvador; muitos dos quais acordando as datas de suas festas religiosas com a Secretaria de Turismo da cidade. “Yá Olga dizia que não queria tombar para que o terreiro dela não virasse o Pelourinho”, referindo-se ao Centro Histórico de Salvador, cujo projecto de revitalização despertou polémicas na medida em que teria privilegiado o comércio e o turismo em detrimento da população local. A impossibilidade de arcar com os recursos necessários para a reforma da casa e do barracão que constituem o terreiro fizeram com que Mãe Olga revisse a sua posição a respeito do tombamento, preocupada com a preservação e a continuidade do Ilé Asè MaroiáLáji.

Tinha muitos amigos influentes, frequentavam a sua casa escritores como Jorge Amado e Zélia Gattai, o etnólogo Pierre Verger, os artistas plásticos Carybé e Mário Cravo Júnior, a cantora Maria Betânia e o cantor ministro Gilberto Gil.

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Buena Vista Social Club, Chan Chan

Por que não aprendemos filosofia nas escolas?

Por CMI Brasil, Por Gerhard Grube
Lógica, causa e efeito etc. Aprender a pensar.
No mundo moderno não temos mais como atuar instintivamente, como os bichos que éramos e ainda somos. Em apenas alguns milhares de anos nosso mundo mudou drasticamente, com a civilização.
Atualmente metade das pessoas vive nas cidades. Vida bastante artificial, bem longe na natureza, que foi nosso professor por milhões de anos.
Os instintos não nos servem mais. Tudo que fazemos e deixamos de fazer tem que ser aprendido. Tem que ser pensado. Por vezes temos que pensar rápido, ou nem pensamos. E tomamos as decisões erradas.
Descartamos o antigo sentido de orientação que nos indicava como ir e voltar de uma incursão de caça e coleta de alimentos. Agora temos que aprender a usar um GPS, para não se perder nas cidades cada vez mais gigantescas.
Decidimos constantemente, pequenas e grandes decisões. Diariamente, minuto a minuto. E o que temos à mão para nos ajudar são os antigos instintos, que não nos são de muita serventia. Não aprendemos nas escolas como enfrentar o mundo moderno!
Atuamos como fazem os políticos e especuladores financeiros: Sem pensar.
Guiados por uma misteriosa intuição, que não é nossa, que não é herança, não está em nossos genes. Mais semelhante a uma simples e pura adivinhação.
Esta misteriosa intuição é que faz a diferença no mundo de hoje. Entre gente comum e os “bem sucedidos”. Intuição que não é aprendida, ninguém sabe explicar o que é ou como funciona. Para alguns é imensamente proveitosa, para a imensa maioria não.
Vivemos nas cidades como num mato sem cachorro. Todos, inclusive médicos, advogados, juízes, policiais, economistas, empresários etc. decidem instintivamente, como se fossemos os trogloditas de outrora. Erram muitas e muitas vezes, e não precisava ser assim.
Um delegado precisa ser bacharel em direito. Mas isso é suficiente para levar a cabo uma boa investigação? Não aprendemos nas escolas como descobrir a verdade e tomar decisões!
Algumas poucas regras e procedimentos aprendidos e estaríamos mais capacitados, poderíamos acertar muito mais.
Lápis papel e borracha, por exemplo. Deveríamos fazer mais uso disso. Antes de tomar qualquer decisão mais importante.
Em vez de fazer tudo de cabeça, num rapidíssimo encadeamento de pensamentos, deveríamos detalhar e analisar passo a passo. Colocar os pensamentos diante de nossos olhos, numa folha de papel. Procurando tratar o problema como se fosse de outrem, para não se deixar levar pelas emoções.
Por exemplo, planejar a realização de sua casa. Tudo que for feito no papel vai custar apenas papel. Até se chegar ao ótimo desejado. Quando então poderá ser construído com tijolo, cimento e dinheiro.
Freqüentemente vemos por aí construções iniciadas e não terminadas. Tudo se estragando no tempo, sendo vandalizado. Acontece muito com gente pobre. Começam mas não conseguem terminar, perdendo nisso o pouco dinheiro que tem. Não planejaram suficientemente.
Por vezes surge uma oportunidade de emprego e temos que decidir. É melhor ficar no emprego atual, ou mudar de emprego?
Comparar apenas os salários é insuficiente. Muito mais coisas estão envolvidas, distância, horário, benefícios, segurança, perspectivas para o futuro etc.
Não deveríamos julgar tudo isso de uma vez só, num único pensamento. Iríamos simplesmente dar maior valor ao que consideramos ser mais importante. Menosprezando o restante.
Poderíamos fazer uma lista das vantagens e desvantagens de cada opção. E sem otimismo nem pessimismo, quantificar, dar peso para cada uma delas. Então somar tudo, comparar. E decidir.
Com isso fez-se racionalmente o que foi possível fazer. E nunca nos arrependeremos da decisão tomada.
Na verdade nunca saberemos se aquilo que não fizemos teria sido melhor ou pior. Já que não foi feito. Esta dúvida sempre vai existir, nunca saberemos a verdade.
A vida é o que fazemos, e não o que poderíamos ter feito. São infinitos os mundos do poderia ser, mas o que realmente vivemos é um só.
Assim temos que nos prover com os meios que ajudem a tomar decisões racionalmente corretas. E o resto compulsoriamente estará errado. Mesmo que eventualmente não esteja.
Deveríamos aprender nas escolas as ferramentas que nos ajudam a viver o complicado mundo de hoje. Para não depender de antiqüíssimos e obsoletos instintos.
Isto, antes mesmo de qualquer outra coisa. Para poder julgar com mais acerto o que iremos aprender e estudar depois. Para não ser simplesmente Maria vai com as outras, como todo mundo.

Nova geração de músicos argentinos desponta tocando ritmos brasileiros

Integrantes do ‘Mão na Roda’, que lançou um CD com choros
Uma nova geração de músicos argentinos tem despontado na mídia local tocando e cantando choros, frevo, samba de raiz, maxixe e outros ritmos brasileiros.
Eles são músicos profissionais, que estudaram nos conservatórios locais e formaram bandas como A Saidera, Mistura e Manda, Mão na Roda e Malandragem.
Se antes eles tocavam apenas em lugares pequenos e afastados de Buenos Aires, agora se apresentam nos principais teatros da capital, como o Alvear, e participam de festivais, como o que acontece nos próximos dias na Província de Mendoza. Eles também fizeram parte das comemorações do mês do Brasil na Argentina, com um show na embaixada brasileira em Buenos Aires, em setembro.
O saxofonista Emiliano Álvarez, de 35 anos, disse à BBC Brasil que é claro o novo interesse pela música “não comercial” brasileira.
‘El Choclo’ mistura tango com maxixe
Grupo Mão na Roda lançou disco de chorinho
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Formatos alternativos
“O axé, por exemplo, sempre faz sucesso por ser mais comercial. Mas agora percebo interesse crescente aqui por outros estilos que não são tão conhecidos do grande público, como o choro”, disse.
Álvarez é um dos fundadores da orquestra A Saidera, fundada há cerca de dois anos. “Samba, baião e choros são os estilos musicais da nossa orquestra?, contou. Ele disse ainda que gosta tanto de Pixinguinha, Ari Barroso e Cartola que pode ouvi-los “sem parar”.
O músico conta que foi num conservatório de Buenos Aires, onde entrou aos 13 anos, que conheceu os colegas com os quais integra a banda, que tem 18 integrantes. “Foi um começo lento, mas conseguimos arranjos de músicos do Hermeto Pascoal, compramos outros e fomos aprendendo desenvolvendo o estilo juntos.”
Férias no Brasil
Ele afirmou que passou a se interessar pela música brasileira a partir de shows na capital argentina de músicos como Egberto Gismonti e que a sua lista de referências musicais inclui Ney Matogrosso, Marisa Monte, Chico Buarque, Toninho Horta e Djavan.
“Somente há pouco tempo viajei de férias para o Brasil. Viajo mais para estudar a música brasileira do que de férias”, disse.
Músicos do grupo ‘A Saidera’, que foi inspirada na orquestra de Curitiba
Álvarez conta que ele e outros colegas de banda fizeram cursos e workshops em Curitiba com músicos e professores locais, e que A Saideira é inspirada a na Orquestra À Base de Sopros, conhecida banda da capital paranaense.
Já Sebastián Luna, deficiente visual, toca cavaquinho na banda Mão na Roda, que lançou no ano passado um CD de choros, com a participação do arranjador brasileiro Rogério Souza.
E por que o nome “Mão na Roda”? “Porque significa uma forma de ajudar e porque a palavra roda também está ligada à roda de samba”, conta o músico Sebastián Pérez, de 30 anos, toca violão, é arranjador e compositor do grupo. “Não temos nada parecido com essa expressão em espanhol.”
Amor à primeira vista
A banda é formada por quatro músicos, que tocam pandeiro, violão de sete cordas, flauta, cavaquinho e bandolim. “Nos conhecemos num conservatório de música e tínhamos interesse pela música brasileira. Mas conhecíamos, principalmente, a bossa nova e não o choro. Quando conheci os choros de Pernambuco, achei que era o caminho. Foi amor a primeira vista”, disse Pérez.
Eles também viajaram para os cursos de música em Curitiba. “Meus pais ouviam João Gilberto e desde adolescente me interesso pela música brasileira. Mas o choro agora nos abre muitas portas. Estamos compondo choros e frevos e transformamos um tango, El Choclo, em maxixe (a música que pode ser ouvida no player acima).”
O também músico Gabriel Trucco, do grupo Mistura e Manda disse que os atraiu a “linguagem riquíssima” de músicas de Pixinguinha, Jacob do Bandolim e de Paulinho da Viola. “Sempre ouvimos muita MPB na Argentina. Mas quando ouvimos estes músicos vimos que podíamos explorar, aprender e crescer”.
O Mistura e Manda tem sete anos e o nome, contou Trucco, é o título de um choro do compositor Nelson Alves. “No início deste ano lançamos o CD Choro Vivo, que inclui choros tradicionais e contemporâneos”, disse.

Analfabetismo entre jovens é maior em favelas que em áreas urbanas regulares

POR Correio do Brasil
A taxa de analfabetismo entre as pessoas com 15 anos ou mais que vivem em favelas é 8,4%, o dobro da relativa às áreas urbanas regulares de municípios que concentram essas comunidades.
A desigualdade social de nosso país reflete-se também de maneira significante na educação
O dado faz parte do levantamento Aglomerados Subnormais – Primeiros Resultados, baseado em informações do Censo Demográfico 2010, divulgado nesta quarta-feira pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O estudo revela que a situação mais grave é encontrada em Alagoas, onde 26,7% das pessoas que moram em assentamentos irregulares são analfabetas. Em seguida, aparecem a Paraíba (21,3%) e o Rio Grande do Norte (16,3%).
A taxa de analfabetismo no Brasil é 9,6%.
Ainda de acordo com o levantamento, mais da metade dos moradores de aglomerados subnormais (55,5%) são pessoas pardas, seguidas de brancas (30,6%) e de pretas (12,9%).
A maior parte da população (34%) dessas comunidades tem rendimento mensal na faixa que vai de mais de meio salário mínimo até um salário mínimo. Apenas 4,6% ganham mais de dois salários mínimos. Entre a população que vive nas áreas urbanas regulares em municípios com ocorrência de favelas, 26% têm rendimentos que vão de mais de meio salário mínimo até um salário mínimo e 27,1% ganham mais do que dois salários mínimos.
O levantamento aponta também que a população das favelas é, em média, mais jovem do que a de áreas de ocupação regular nas cidades com comunidades carentes. Enquanto nos aglomerados subnormais a idade média dos moradores é 27,9, nessas outras regiões urbanas é 32,7.

Mulher saudita é executada, acusada por praticar bruxaria


O Ministério do Interior da Arábia Saudita informou nesta terça-feira que uma mulher foi executada por praticar “bruxaria e feitiçaria”.
Uma declaração publicada pela agência de notícias estatal da Arábia Saudita informou que Amina bint Abdul Halim bin Salem Nasser foi decapitada na segunda-feira na província de Jawf, norte do país.
O ministério não deu mais detalhes sobre as acusações contra a mulher.
Amina foi a segunda pessoa executada pela acusação de bruxaria na Arábia Saudita em 2011. Um homem sudanês foi executado pela mesma acusação em setembro.
O jornal árabe al-Hayat, baseado em Londres, informou, citando um membro da polícia religiosa, que a mulher tinha cerca de 60 anos e convencia as pessoas que podia curar doenças em troca de dinheiro.
Sebastian Usher, analista regional da BBC, informou que Amina foi presa em abril de 2009.
Anistia Internacional
O grupo de defesa dos direitos humanos Anistia Internacional, que fez campanha para que outros sauditas sentenciados à morte por acusações de bruxaria sejam inocentados, informou que nunca tinha ouvido falar do caso de Amina até o momento, segundo Usher.
Em 2007, um cidadão egípcio foi decapitado depois de ter sido acusado de usar feitiçaria para provocar a separação de um casal.
Em 2010, um libanês condenado à morte por acusação de bruxaria, foi libertado depois que a Suprema Corte saudita decretou que as ações do homem não causaram danos a ninguém. O homem apresentava um programa de televisão onde ele previa o futuro.
A Anistia Internacional afirma que a Arábia Saudita não define bruxaria como crime que pode ser punido com a pena de morte. No entanto, alguns dos clérigos mais conservadores do país pediram que pessoas que preveem o futuro e curandeiros recebessem as punições mais severas possíveis, pois elas seriam uma ameaça ao islamismo.

Polícia encontra alunos acorrentados em escola do Paquistão

Madrassa mantinha adultos e crianças; muitas das escolas islâmicas paquistaneseas são irregulares
A polícia do Paquistão libertou cerca de 50 estudantes de uma escola religiosa, chamada de “madrassa”, na cidade portuária de Karachi, uma das maiores do país.
Vários dos estudantes, alguns com 12 anos de idade, eram mantidos acorrentados. Outros teriam sofrido espancamentos, não eram alimentados e eram mantidos no que a polícia descreveu como câmara de tortura.
Alguns dos pais pagaram para que as crianças frequentassem a escola, conhecida como “madrassa cadeia”, pois os filhos eram viciados em drogas ou estavam envolvidos com crimes.
Alguns dos estudantes conversaram com a imprensa enquanto ainda carregavam as correntes que os mantinham presos na escola religiosa, cujo regime de disciplina eles descreveram como brutal.
Um deles afirmou que os responsáveis pela escola falavam aos estudantes que eles seriam enviados para se juntar à jihad e que, se tentassem escapar da ?madrassa?, seriam castigados com 200 chibatadas.
Um outro menino afirmou que membros do Talebã visitavam a escola e disseram aos estudantes que eles deviam “se preparar para a batalha”.
Reabilitação
Pelo menos duas pessoas que ajudavam na administração da escola foram presas, mas o diretor fugiu. A polícia informou que já abriu um inquérito.
“Cada possibilidade, incluindo este envolvimento com militantes, será investigada”, disse à agência de notícias AFP, Sharfuddin Memon, porta-voz de negócios interiores para a Província de Sindh, onde fica Karachi.
Muitos pais deixam seus filhos na “madrassa” à procura de tratamento médico para dependência. Para eles, o regime severo ajudaria na reabilitação.
Estudantes eram mantidos no porão, onde eram torturados como forma de reabilitação
Alguns dos países disseram à BBC que estavam felizes com o resultado e que os filhos foram acorrentados para que não escapassem do local.
“Se uma criança tem problemas, como má companhia, tabagismo e drogas, então não temos escolha a não ser levá-la para tais lugares”, afirmou Mohammed Qasim, o pai de um dos alunos.
‘Tortura e abuso”
Os estudantes foram encontrados presos durante uma batida policial na noite de segunda-feira.
Segundo a imprensa paquistanesa, os investigadores receberam uma denúncia de que a escola mantinha estudantes vivendo no porão, sob tortura.
Existem milhares de “madrassas” no Paquistão. As escolas garantem a educação para mais de dois milhões de estudantes, segundo estimativas.
Há muitos colégios irregulares no Paquistão, sendo que muitos deles são a única opção para crianças de famílias pobres.
Algumas “madrassas” do Paquistão também são acusadas ??de funcionarem como campos de treinamento para militantes islâmicos. A escola de Karachi, no entanto, era apenas usada como centro de reabilitação, segundo a polícia.